MINHA LAMPARINA
Minha lamparina vem iluminando a casa, apagando a escuridão e clareando minha mente,
Para um passado ausente no meu tempo de infância, lembranças e mais lembranças...
Apaga essa lamparina menina e vai dormir!
Era a voz em tom firmado que vinha do outro lado de uma parede de taipa,
E a lamparina se apagava num sopro forte e comprido, O cheiro nunca esquecido da fumaça que subia e lá nas palhas se escondia ou saia pelas frestas onde a lua aparecia, ah! Como eu gostava de adormecer sentindo o cheiro dela subindo,
A minha lamparina tinha hora de acender e apagar.
Depois de o terço rezar, no adormecer do sol quando a noite vinha surgindo mostrando seu arrebol, minha lamparina era acesa para a casa clarear,
E aquela voz suave começava a me chamar...
Vem pra mesa menina! Já vou botar o jantar,
Depois de barriga cheia era hora de brincar, no terreiro a meninada começava a chegar, E os mais velhos se sentavam pra fumar e prosear,
Ai começava a contar as historias de Trancoso que chamava a atenção do mais velho ao mais moço, A meninada corria pro o pote no canto da sala tomar água bem fresquinha, sem bulir na da quartinha que minha vó conservava, E todos iam escutar as historias engraçadas que vazia arrepiar, amedrontar e dá risadas,
Depois de algumas historia o cachimbo já vazio...
Vá buscar fumo pra mim, na gaveta da banquinha, na latinha de manteiga já bem enferrujadinha, traga o cepo de cortar fumo, a faca e a lamparina, depois do cachimbo aceso... Vá deixar lá na cozinha,
Corria eu apressada para historia não perder, no abalo a lamparina começava a escorrer, o querosene na mão na volta que logo eu dava, mas sem ninguém perceber na rodilha eu enxugava, e corria para ouvir o folheto de cordel que ali já começava,
No final da bela historia todos pra suas casas voltava, e meu avô já esticando a rede que na corda era enrolada, dava-lhe duas sacudida e depois uma açoitada, O lençol era bem branquinho feito com sacos de açúcar que vinha do alto sertão, com cheirinho de anil que acalmava meu coração,
O ritual de lavar os pés não podia esquecer, E a minha lamparina me acompanhava em tudo que eu fosse fazer, clareando a minha vida, como posso me esquecer?
Depois do deus te abençoe! Em minha rede deitada, a coberta bem quentinha do pé ao pescoço enrolada, a oração do santo anjo, E a lamparina é apagada.