O TEMPO QUE ANDA
O calor do chá que se dissolve na fumaça
O passar das horas, tudo se esfria
Nota-se aí..., nota-se aí que o tempo passa
As mãos, que escrevem mais lentas
A mente cada vez mais desatenta,
A vista que se embaraça
Nota-se aí... nota-se aí
Que o tempo passa
Confere os mortos da família, outrora feliz
Na imagem da foto puída que o tempo desgasta
O peso dos anos na curvatura do corpo
Nota-se aí...., nota-se aí que o tempo passa
Olha os trilhos dos bondes enterrados
Os bancos carcomidos na praça,
Agora sujos e vazios
Onde suas estorias de amor fluiram
Quantas lembranças gastas?
Nota-se aí..., nota-se aí que o tempo passa
As latitudes da existência cada vez mais estreitas
Os olhos diminutos, o passado rarefeito,
Os raios de luz da manhã, embaçados na vidraça
Nota-se aí...., nota-se aí que o tempo passa
Rostos novos na família
A vergonha de não mais poder andar
As folhas mortas no chão,
A falta de afeição, a conversa sempre escassa
Nota-se aí...., nota-se aí que o tempo passa
A terra suspensa no cosmo, dando voltas sobre si mesma
Homem e a terra presos nas mesmas garras
Mais uma vez, vê a luz do sol se pondo, morrendo
Mais um dia que se passa
Nota-se aí...., nota-se aí que o tempo passa
As rosas sem viço, a paisagem pobre, sem graça
O murmúrio do mar no ouvido, as mãos frias
A poeira nos beirais, o pó encardido dos vitrais
Nota-se aí,,,,, nota-se aí, que o tempo passa!
Quer desenterrar os sonhos,
Não mais pensar na insipidez da vida
Na pergunta incômoda: há quanto tempo ninguém lhe abraça??
Percebe sua inutilidade, a presença da morte, suas trapaças
Tece por fim, a esperança tola de ser redimido,
Nota então, nota então, que o tempo passa!