De um desalmado só
Então veio o silêncio
Como uma pedrada entre os olhos,
Deixando cego o expectador da guerra
O silêncio veio furtivo como uma noite num dia nublado,
Como uma lembrança de infância, carregada de ressentimentos.
O silêncio veio e fechou a porta da frente e cortinou as janelas.
Derramou as águas acumuladas nas calhas da casa.
Veio o silêncio, e esvaziou os quartos de dormir, levou embora o sono, jogou fora as chaves dos armários trancados da alma.
O silêncio empoeirou os sofás da sala, a televisão, os DVDs piradas e o oratório preto de madeira cheio de louças novas.
O silêncio violentamente rompeu as cordas do violão afinado,
Desafinou as cordas vocais do tenor,
Desligou o carrinho de som que tocava músicas bregas ao meio dia, parado no meio fio da calçada.
O silêncio desgastou as pontas das canetas nanquins descartáveis, deixou a folha do desenho em branco.
O silêncio riscou cadernos e copiou estruturas de textos de autores famosos.
O silêncio calou o meu nome...
Levou embora a fala, a poesia, encouraçou a expressão, apagou do smartphone as conversinhas passa tempo de minutos, demitiu do cotidiano os substantivos carinhosos empregados.
Calou a angústia e o riso, calejou a incerteza e a fé.
Desajuizou o sábio. Simulou sabedoria.
Camuflou a existência.