Quebra-cabeças
Talvez algum dia,
olhes para mim com complacência,
como um quebra-cabeças que não conseguistes montar,
como um quadrado mágico de cores tão díspares,
escrevendo versos após as badaladas da meia-noite,
trilhando caminhos escuros em busca de vaga-lumes,
saltando ondas num mar revolto na escuridão de um céu sem estrelas,
assim poderias me entender melhor nessa revoada de pássaros,
assim poderias me enxergar de verdade em meio aos rabiscos,
alguém que transita entre os rascunhos e o material concreto,
alguém que se desfaz ao vento e se recompõe à luz da lua,
como um relógio de bolso parado na hora de um novo amanhecer...
Talvez algum dia,
escutes minha voz em uma rádio distante,
entoando uma melodia familiar que nunca ouvistes antes,
chamando-te à memória minhas palavras cruzadas,
como um corvo que aprende a cantar sem se tornar um sabiá,
um velho amigo de caminhos longos tropeçados no sumiço,
um sonho que adentra sua mente quando estás para acordar,
uma sensação que a acalenta em dias de nevoeiro cinza,
assim poderias começar a me desvendar em cartas soltas de tarot,
assim poderias traçar minha rota no globo dos pontos cardeais,
como um passageiro sem destino no trem de uma vida sem paradas,
como um visitante do chá das cinco em uma Londres sem Big Ben...