Poema I
O poeta não é poesia se não valoriza o pouco
Se não vê que o chão que alimenta o homem
Também há de ser o melhor amigo do julgado louco
E é lar merecido às belezas que da vida somem
Para que a delicadeza da vida viva n'outro.
Então por que menosprezar a lágrima dos que sofrem
E dizer ser pouco o sincero beijo que deram em seu rosto
Ou o afago dado a qualquer hora, sem pudores
Por pessoas que ainda brilham diferentes cores
Quando todos os desejos em dois olhos cabem
E o mesmo amor que destes beijos nasce
Fez nascerem todos os outros amores
E é tudo o que, no fim, afaga nossas dores?
Afinal, a mesma vida onde o mundo gira em dança
Desabrochará cada flor, sorriso e esperança.
O amor é único, como todo sentimento
Que não vê a quem e não procura razão
Não aspira por privação ou negação
E não tem tamanho, padrão ou momento
Pois a mesma vida que cria gigantes
Faz brotar da terra infinitos bichos rastejantes
E o mesmo contar do relógio que matou o vil inseto
Tornará poeira cada centímetro de concreto
Que hoje faz parte da nossa pretensiosa criação.
Extremos que fariam morrer o sentido do horizonte
Se prendêssemos o livre em nossas mãos
E tão logo perder-se-ia o sentido da imensidão
Se ela não coubesse em nossa própria imaginação.