Órfãos da chuva

São órfãos

aqueles que deitam na cama

olham para o teto

e esperam a insônia morrer

enquanto ouvem a chuva

São órfãos

aqueles que se encostam no umbral

esperando o mensageiro dos bons tempos

no seu deliberado cultivo a felicidade

enquanto contemplam a chuva

São órfãos

aqueles que se deleitam com fotografias antigas

remoendo memórias de outrora

felizmente eles também já se foram

como seus amores, apagados,

mesmo a mais doce cena de baile

enquanto a chuva os molha

São órfãos

aqueles que planejam o suicídio na densa noite

e não o fazem, abafando mais um fracasso

nos travesseiros bêbados de lágrimas

enquanto a chuva cai

A chuva para o seu canto

de todo céu, de toda terra

anjos e demônios descansam

E eu penso: o que será dos órfãos?

Quantos se vão com a chuva nesta noite?

Quantos deles dormem em posição fetal?

Quantos deles morrem olhando o nada em suas janelas?

Que grande orfanato é este mundo!

A chuva recomeça...