LEVANTA, E ANDA!

Não costumo ser eficaz,
quando se trata de lançar
o verbum volat,
para soçobrar algumas palavras
que contenham conforto
a almas que padecem de dores
e angústias contritas.

Talvez o hábito de olhar
para os destroços da ponte
se tenha enraizado
com severidade em meu ser;

talvez a visão de mim próprio
e os fantasmas que me habitam
tenham me embrutecido,
a ponto de não contemplar mais
do que os vazios e os nadas
inaugurados pelo acidente
abnormal.

De qualquer modo,
gostaria de dizer algo:

Grande atraso há
nos que fazem a escolha
pela angústia e pelo lamento,
porque se tornam um vazo seco
pelos jardins das gêneses
de nossos coirmãos.

Vedes aquela criança abandonada,
maltratada e tantas vezes
humilhada por nós,
que, distantes, assistimos a tudo
sem darmos o grito severo
aos que pregam o bem e a fé
com seus deuses ideais,
trabalhando com suas dignidades ideais,
morando em suas casas ideais
com suas famílias ideais;

como que se fosse tão bastante,
cada um de nós termos
o que nos seja ideal,
mediante nossas retinas cegas
em vez de,
além dos frágeis esforços
e dos regozijos
que soltamos por aí,
fazermos algo concreto
para mudar algo
nesse desalinho todo?

Vedes a dor da mãe ou do pai
que perderam o filho,
ou do filho que perdeu os pais,
ou sua daquele cara que perdeu
a quem realmente amava,
ou vice-versa,
e todas as pedras que estão
a nos ferirem pelo caminho
todos os dias?

Vedes a admirável fome
dos pregadores de verdades,
de fés e de esperanças
em suas esplêndidas sinagogas
ou de seus próprios cernes,
alvecidos por si próprios
com a visão de serem filhos
à imagem e semelhança de Deus;

e dos cães, e dos vermes,
e dos que andam a ruminar
desastres por aí?

Vedes os fiéis reflexos de tudo
e de ti mesma em tudo,
no vasto mundo de sismos
e de abismos em que estamos?

Sim, há grandes dores e angústias
nessa jornada estranha
pelo qual andamos,
eu bem sei disso.

Deus, como eu sei disso!
Como posso sentir
vossas dores e vossas angústias,
e ter apenas a dizer
que se trata de uma fria
condição da singularidade
da qual viemos!

Mas não quero falar de mim,
talvez esse pouco tenha sido
necessário apenas para ilustrar
o que quero que reflitais:

Porque vos permitis
deitardes com essa dor na alma
e padecerdes por tempo demasiado
em angústias e dores,
se precisam de vós,
às vezes, com imperativos
outras, com sílabas orvalhadas?

Por outra, saibais
que as apresentações
podem matar ou salvar
aos demais atores
do grande palco
da vida,

mas vossas dores
e vossos silêncios
só podem vos matar,
a vós mesmos,
em um ato covarde,
por desistência de usardes
da força que tendes.

Seria um desastre desistir
da anômala condição
que nos constitui,
pois ainda temos nela,
enquanto estivermos na grande barreira
onde a tudo inauguramos,
o poder de escolhas,
advindo da senciência
de nossos egos:

E quero dizer, confirmar,
reiterar que não sejais como eu,
um niilista entregue
a uma vivência de descrenças
e desesperanças,
por vê-las de modo já espúrio
na nascitura da obra.

Eu me transformei nos dejetos
dos reflexos,
e nem para refletir algo
com minha visão fausta,
ando sabendo.

Digo mais,
se o mundo fosse composto só
de pessoas como eu,
certamente o inferno
se habitaria mais plenamente
entre nós.

Por isso, quero vos dizer,
neste momento,
que façais vossas escolhas
da melhor forma que puderdes
para vós mesmos;

e, sobretudo,
para como lidardes
com vossos irmãos,
que eles não sabem
da avassaladora e tênebra
condição que possuímos.

Então, se amardes,
não exijais amor ou posturas,
ou qualquer outra coisa em troca;
antes, amais com um amor maior,
com uma dor maior,
ama com sofrimento maior,
porque todos temos nossos
próprios espinhos.

E jamais vos silenciais,
jamais vos deixais cair
para vos descansardes,
jamais vos entregais
ao que vos possa prostrar,

que os templos ainda puros,
que os profanadores de verdades,
que os regozijadores de sublimidades,
que os imperativistas que provocam
as torrências e as guerras;

todos eles precisam ouvir algo.

Percebeis como
não podeis vos calar,
devido às dores ou ao vazio
que possais sentir na alma?

Levantai-vos, pois,
e não sejais como eu,
um inútil niilista
que se tornou cinzas
em meio aos destroços
que anda a ver de modo
tão abissal.

Levantai-vos e andai!

E apressai-vos!

Que o tempo não volta
para que, no porvir,
lamentais o dia de hoje!

Péricles Alves de Oliveira
Péricles Alves de Oliveira (Thor Menkent)
Enviado por Péricles Alves de Oliveira (Thor Menkent) em 19/12/2013
Reeditado em 19/12/2013
Código do texto: T4617931
Classificação de conteúdo: seguro
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