A(PENAS) 
Juliana Valis



Ah, se eu pudesse viver apenas

De escrever poemas...

Ah, se pudéssemos viver definitivamente

Apenas de escrever poemas

E não morrêssemos tão parcamente

De fome ou de raiva ou de solidão,

Talvez fôssemos sonhos com nome na direção da vida,

No céu que some, assim, enquanto os versos vão...



Mas o mundo é dos computadores que não sentem !

E nós, poetas, sentimos tanto, até nas trôpegas dores

Mais deletérias que não nos mentem

Até que nos rendam às palavras nos véus de amores,

Como céus sem cores que desabarão em nós...



Mas o mundo, ainda assim, é das moedas que não sentem,

Dos empresários que confeccionam até risos sem calma,

Dos estadistas em suas grandes casas brancas, rosas ou amarelas,

Dos “belos” milionários que fazem plástica até na alma,

Como se fossem tão humanas as cédulas desfilando nas passarelas !





Céus, terão matado a poesia ?

Homicídio doloso triplamente qualificado

Pela corrupção, pela violência, pela hipocrisia,

Pelo sentimento que simplesmente não se descreve

Diante de um mundo tão estúpido que nos irradia

Essa sensação de sermos números, apenas números ?



Não, não queria ser mais nada, muito menos robô !

Muito menos peça ínfima nessa estrada digital do mundo

Onde tudo é labirinto transcendental da dor,

Como grito mudo no verso mais profundo,

Quando a alma chora, suplicando amor...



Pessimismo ? Meu bem, o que é pessimismo ?

O que é ou o que não é qualquer coisa vã ?

Se a alma nos clama além do vil abismo

Em prol do sonho sempre no amanhã,

Podemos colorir no photoshop a dor de um cataclismo,

Mas onde estará o amor nessa aventura sã ?



Sim, onde estará qualquer coisa além de adjetivos,

Além das aparências, dos cartões de qualquer crédito,

Nesses corações que ainda pulsam vibrantemente vivos,

Ou mortos nas televisões a cada pesadelo inédito ?

Ah, dirão os farmacêuticos, viva os caríssimos anti-depressivos !



Foi-se o tempo, assim, em que Freud explicava

O que seríamos ou não além de labirintos sós,

Bem ou mal, enquanto o verso brincava

A ser o inverso do sonho a desabar em nós,

Como êxtase do inconsciente...



Céus, passamos tantos anos nas escolas

Fingindo aprender o que só a vida ensina,

Pra depois suplicarmos ao mundo nossas vis esmolas,

Na máscara de ser feliz como se houvesse sina,

Como se houvesse rima na matéria tão valorizada

Enquanto a alma se perde em cada vil esquina...



Desculpe-me ! Gostaria de ter escrito sobre amor, apenas,

Além da minha insignificância estupidamente metafísica,

Sou nada nessa mente a lhe dizer dilemas,

Mas queria a estrada que nos levasse à paz idílica

Além do impasse diluído em tempos tão mecenas,

E tudo isso surgiu da suposição que nos descrevesse:

Ah, se pudéssemos viver a(penas) de escrever poemas,

Eu juro, inutilmente eu não teria escrito este.