PORQUE OS MUITO ÍNTIMOS NÃO ME PERDOAM

Na manhã de 29 de junho de 2013

Talvez, talvez os muito íntimos não me perdoem

talvez, talvez

assim me abandonem

antes e acima de tudo, porque

à minha revelia

sem que o soubesse

sem que o tivesse pretendido

muito menos premeditado

eu tenha acabado por me tornar só o pano

que lhes limpou os espelhos

bem como eu

o pano que também limpou-me o próprio espelho

e quase ninguém suporta

estar defronte a um espelho límpido

muito menos perdoa

àquele ou aquilo

que lhes limpou os espelhos.

Como já disse

limpei também meu próprio espelho.

Este limpei premeditadamente

e, muitas vezes, de olhar-me nele

no meu espelho

me horrorizo

e tento

mesmo com o tão pouco amor que me tenho

perdoar-me

um pouquinho, que seja,

um grão, que seja,

em cada dia dos dias.

É verdade que quase nunca o consigo, perdoar-me, esse grão,

ao menos tento.

Eles não o conseguem

nem mesmo o tentam,

os íntimos muito íntimos

que, a despeito de tudo,

- das sombras em nós todos -

me são tão caros.

Não conseguem nem tentam perdoar-me

por eu, à minha revelia e sem sabê-lo

ter me tornado o pano

que lhes limpou os espelhos.

Não devo mais

esperar pelo perdão

que nunca virá

dos meus muito íntimos

que não lhes é possível

perdoar-me

pois seu amor por mim

consegue ser ainda mais parco e pouco

que o meu próprio amor por mim

e onde amor quase nenhum

pode caber algum

pequeno que seja

perdão?

****************************************************