Palavra

De palavra em palavra,

tudo há de fazer sentido,

naquilo que sai da boca

e nos perfura o ouvido.

Tem inveja a palavra escrita

daquela que é dita,

maldita, bendita

no perfume da voz, na foz do som.

O escritor conforma-se apenas,

no valsar dos olhos do leitor

silencioso, afeito ou não.

A palavra escrita,

selpultada em papel-cartão

e lida em oração metal,

sofrerá a ação do tempo e morrerá,

cobrindo-se de amarelo intenso

a menos que seja dita.

Por isso, tem inveja a palavra escrita

daquela que é dita.

A propósito, a escrita estancada,

presa na tela ou no muro,

amarga o dia duro de solidão.

Cansada do repúdio da visão,

converte-se em outro palavreado,

palavrão, só para chamar a atenção.

Trapaça ou golpe baixo,

agora será mais facilmente dita,

pois irrita-se o ego ao ser tocado

quando o xingamento sai sonoro, fonetizado.

Marcado na memória como mágoa

que água nenhuma lava,

será eterno porque foi dito.

Maldito escrito dito.

Acredito dizer a verdade

travestida em escrita,

para mesmo assim correr o risco

de nunca ser lida em voz alta.

Se bocas não faltassem para dizer

o que escrevo, para nunca deixar morrer

o enlevo de gentileza, que beleza seria!

Felix Ventura
Enviado por Felix Ventura em 01/04/2007
Código do texto: T433267
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