PAISAGEM AO ENTARDECER


Meus cabelos começam a se transformar em névoa,
e os dentes em folhas levadas pelo tempo...
A pele, como um passarinho, já se encolhe no seu ninho,
tentando guardar em suas fímbrias a candura
e a beleza dos últimos raios de sol.
As mãos começam a ter forma de raízes,
cheias de fendas e curvas,
registrando em sulcos profundos,
os aclives e declives da grande jornada.
As costas já não têm a força dos rochedos,
e adquirem, lentamente,
a postura da árvore, que do alto da colina,
tudo vê, mas já verga ao peso de seus galhos.
Agora há um pouco de sombra nos jardins.
Esses, onde as flores formam buquês a cada novo dia,
onde as borboletas perambulam de flor em flor
para escolher a mais bela e mais perfumada.
Mas a alma! Ah, a alma ainda é uma menina de tranças.
A alma é uma manhã clara, de um infinito azul,
onde o tempo corre brincando com a bola da Terra,
brincando de esconde-esconde com a lua
e de passar anel com as estrelas.
A alma ainda é essa varanda onde pousam beija-flores,
onde os violões gemem diante das saudades,
onde os chinelos falam de aconchego e amor.
Essa alma, como uma criança,
ainda sonha
com o grande abraço do amanhã.


(Direitos autorais reservados).


 
Lúcia Constantino
Enviado por Lúcia Constantino em 31/05/2013
Reeditado em 29/09/2013
Código do texto: T4319136
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