Na tolda do barco, eu fico

Gurupá, dezembro de 2003

Estrelas tão perto,

tão perto de minhas mãos.

Não posso evitar:

ergo-as e seguro as luzes,

elas tentam fugir.

Opa! A Estrela D´Álva, não!

Quieto, menina!

Espalho-as no céu.

Agora tenho constelações

que eu quiser.

O cacho de açaí,

o camarão,

a rede com um menino dentro.

É só balançar, balançar.

Cadê a tesoura?

Ah, tá aqui!

Voa, tesoura, voa

pra rumo do mosquitinho

que vai em sua direção

lá longe...

como eles me vêem?

Sou velho ou sou novo?

Talvez eu nem brilhe tanto

aos seus olhos

e elas me espalham

como eu as trato,

me formam constelações de humildade,

pequenice,

dúvida

e infinito.

Afinal, quem será o eterno?

Acho que somente o Criador

que nos espalha.

Resolvo então cair pra junto delas.

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Um só nós somos,

em todos os tempos,

em todos os cantos,

o cacho de açaí,

a paz,

a luz,

o olho,

o já era,

o agora,

o será,

a estrela,

a estrela...

- acorda, moleque,

desce daí,

que teu pai já vai ligar

o motor do barco!

Quer cair no rio???

- Já vou, mãe,

já vou pro sonho da rede.