TUDO A DECLARAR
Juliana Valis



Que tal declararmos 

A renda per capita

Do imposto de viver ?



Que tal declararmos

No verso, além de nós,

O inverso de nossa alma ?



Que tal declararmos, no fim,

O começo de absolutamente tudo,

Como labirinto mudo do nada, assim ?



Sim, nada mesmo faz  o menor sentido,

O mundo já é  estúpido, por si só,

E me esmaga, cruel e atrevido,

E nos agride, sem fé, nem dó !




É bom, de fato, declarar amor,

Mas o mundo exige declaração de renda,

É útil declarar quem sou,

Mendigando verso na dor que prenda ?



Não, é inútil, inócua a dor de ser

E ter que existir, sem querer, 

Sem declarar à lua que nos faz sorrir

Um átimo da rua que se esvai daqui,

Sem dizer adeus, sem declarar jamais....



Que tal declararmos moratória

A toda violência que o mundo traz ?

Em toda estupidez inglória, 

A revolução declama uma ode à paz !



E ainda assim  nos resta

Tudo, tudo mesmo a declarar,

Nada, nada mesmo presta 

Ou tudo parece nem sequer prestar ?



É bom, de fato, declarar amor,

Mas o Estado exige declaração de renda,

Cobrindo tarifa de nossa própria dor,

Até que o medo em sua cor nos prenda...


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