::: A POESIA :::
Meus fragmentos dispersos evocam as minhas necessidades.
Vejo por todos os cantos de mim os versos que se alastram pela vida
E sou em cada um deles um fragmento da inquestionável existência.
Há minha caneta tinteiro, meu relógio de bolso e o meu terno no cabide.
Tantas coisas podem definir-me, mas nada como os meus versos secretos,
Versos que choram com os meus medos e riem com os meus sonhos.
Versos que sangram a putrefação social, mas que aqui a ignoram.
Versos que gemem, sofrem, cantam e verbalizam minha incongruência.
Não tenho nada a dizer, mas minha alma tem que exclamar sua voracidade
E os incontidos leões que nomino por consciência e emoção.
Há também, nessa prosopopéia, a minha famigerada alcatéia de vícios,
Carniceiros sentados ao lado do nada esperando tudo que reste para si.
Ou seja, minha alma e meus goles ociosos de respiração.
Mas não adianta correr das margens dos rios que emanam do meu ser
Existem versos que deles fluem em cada gota de ar inspirado,
Existem versos sonolentos no romper da manhã enternecida,
Existem versos tristes, alegres, românticos... Existem versos.
E sei que no romper fétido de minha couraça mortal são eles, os versos,
Tudo aquilo que faz o meu ser existir além da sua mera sobrevivência.
As doridas dobras de meus dedos rústicos como a minha face
Desenham códigos verbais que interpretam a mais profunda alma.
Não rogue de quem escreve a alma eloqüência ou técnica...
Não anule a arte nas regras, nas métricas ou nas conjugações verbais.
Quem me dera sabê-los, mas que do meu tempo o conhecimento é raro
E a arte é distorcida face aos demônios sociais da ignorância.
Mas ainda tenho no meu peito algumas rimas adormecidas,
Rimas que aludem à contingente necessidade de ter na partida
Das surdinas palavras do meu peito o manancial de sensações.
Rimas dos meus versos que invocam para si guaridas
Para ter sempre no seu existir a tão bela e querida
Valorosa nascente de sua mais frenética fonte das paixões.
Sim, eis que são os meus versos os fragmentos do meu eu
Que devoram a cada gota deste cálice que chamo de vida
Um manancial de sonhos e sentimentos que cobrem o céu.
Se sou nas perpendiculares margens do rio o barco só de ida
É por que amei cada instante e os versos (meus fragmentos),
Fragmentos notórios dos meus mais secretos sentimentos,
Com toda a intensidade que meu peito pode bradar.
E assim, quando a madrugada é amante dos meus lábios
Ruborizados pela cor emocionante do vinho,
Sei que os meus versos (que são os meus fragmentos)
Se tornaram eternos na felicidade que pude ter
Ao escrever A Poesia.