Por que a vaca não dá poesia?

Acho que foi Mário Quintana,

Que amolou a esquecida faca;

Acusou-nos, todos, os poetas,

Ninguém faz versos pra vaca.

Seu alvo sangue corre a vida,

Quem se furta a esse mamar?

Contudo, eis a vaca esquecida,

bem, não precisava avacalhar...

Usamos e abusamos da figura,

Sem o fito de fazermos poesia;

Olvidada musa, ei-la, obscura,

e sempre voltamos, à vaca fria.

Rara, en passant, uma menção,

É o que damos, o seu privilégio,

Refugiados em figuras melhores,

de medo que a vaca vá pro brejo.

Acho, desperto a outros culpados,

que lendo-me, vestem a carapuça;

urge que se faça esse desagravo,

não desisto, nem que a vaca tussa.

Vá cá véia nem queira uma poesia,

Diria o caipira no seu rústico dizer;

Mas, assola, o ter visto esse vácuo,

e, me soa urgente, tentar desfazer.

Ela segue aleitando filhos ingratos,

reféns de musas, que não dão nada;

ignora, altruísta, os hindus acertam,

Não é deusa, mas a vaca é sagrada...