A CHUVA
Ininterruptamente, chove na pequena cidade.
Há tempos não se vê o nascer ou o pôr-do-sol,
O céu acinzentado apresenta-se constante
Tal qual a melancolia dos desvairados.
Fico à janela a olhar e a refletir...
Será esta pequena cidade o início ou o fim do mundo?
Na rua, não se vê quase nada
A não ser as incessantes gotas d’água que caem.
Vez ou outra um movimento, um passar,
Quase sempre rápido, como a fugir de algo tenebroso
Que persegue, que aflige, que espanta.
O tempo triste faz triste o semblante das pessoas...
Uma bela mulher passa elevando-se o espírito...
Para onde vai? Irá para casa ou se abrigará com alguém?
Ah! Poxa vida! Flecha trespassada em meu peito!
Que vontade de cair nos braços daquela mulher!
Um casal passa, abrigados a um só guarda-chuvas.
Abraçados, não parecem ligar para as gotas cadentes.
Quem sabe o que dizem ... Serão juras de amor?...
E minha solidão torna-se ainda maior!
Um menino passa... Pés no chão, calção desbotado pelo uso constante
Camisa rasgada... Um maltrapilho!
O cabelo está molhado como a terra em que pisa.
Vai comprar bebida para o pai...
Ele sempre passa à mesma hora todos os dias.
Faltam-lhe roupas, carinho, compaixão, amor...
Falta-lhe tudo, até a paz que seu rosto implora.
Entretanto, não falta ao pai a bebida que entorpece,
E minha tristeza torna-se ainda maior.
Neste momento, o dia está extremamente escuro,
Como a alma deste poeta que aguarda a noite chegar
Para nela se amparar e, num longo abraço,
Deitar um sono bruto, esperando o próximo dia.
Mas, no próximo dia, também haverá chuva!
A mesma chuva incessante, bela, calma,
Pálida, monótona e eterna,
Trazendo a minh’alma a loucura delirante ...
Não tenho a bela mulher que passa,
Não tenho a companhia dos enamorados,
Sequer tenho a força que impele o menino a continuar.
Não tenho nada, senão a chuva que cai ...
Não quero mais deixar de ouvir o pingar das gotas d’água nas telhas ...
Minh’alma, neste momento, está tomada de tristeza,
E aguarda apenas a chegada da noite mais escura ...
Da noite ininterrupta ... Para nela se abrigar eternamente.
Péricles Alves de Oliveira