TENHO MEDO DESSA TAL DE LUCIDEZ
Eu tenho medo
Dessa tal lucidez
Da embriaguez
Que não alucina
E mostra as duas faces
D’ uma só vez
Eu tenho medo
Do português,
Das palavras ao sujeito
De barba, cabelo
E bigode que lambuza
Dedos e pêlos
No recheio do pastel de Belém
Tenho medo de me entender
Nessa voracidade
Que a imagem da gula comporta
E se recolhe no meu ser
E me impele a dizer
Frases com sensatez
Ando a divagar pensamentos magros,
A encarar a luz branquela do poste...
Do tom amarelo, embora goste
Cego-me de medo da luz
Do que é velho
Em ti, em mim, em todos vocês
Que vieram aqui
Só para saberem
Desses medos todos,
Deste medo
Vermelho-horroroso
Que se dissimula por frases
Pontuadas por quases...
Acordo cedo
Quando em vez
Deste sonho que vem
Do miolo da nitidez
Do terror que me consome
E dá-me um medo
Que corre
Que fica
Que pega
Que come
Medo.
Apenas medo.
De que eu possa ser algo mais
Do que um homem