Coração nevado
Batem leve, levemente,
Como quem chama por mim ...
Será chuva ? Será gente ?
Gente não é certamente
E a chuva não bate assim ...
É talvez a ventania;
Mas há pouco, há pouquinho,
Nem uma agulha se mexia
Nessa quieta melancolia
Dos pinheiros do meu jardim...
Quem bate assim levemente
Com tão estranha leveza,
Que mal se ouve, mal se sente ?
Não é chuva, nem é gente,
Nem é vento com certeza.
Fui ver. A neve caía
Do azul cinzento do céu,
Branca e leve, branca e fria...
Há quanto tempo a não via!
E que saudades, Deus meu!
Olho-a atravez da vidraça.
Pôs tudo da cor do linho,
Passa gente e, quando passa,
Os passos imprime e traça,
Na brancura do caminho ...
Fico olhando esses sinais
Da pobre gente que avança,
E noto, por entre os mais,
Os traços miniaturais
De uns pézinhos de criança ...
E uma infinita tristeza,
Uma funda turbação
Entra em mim, fica em mim presa.
Cai neve na natureza ...
- e cai no meu coração.