Boa lã

Nos meus arredores nasceu uma ovelha

Ela gritava de horror, desespero, não sei

Adiantei pro encarregado: cale essa besta!

Pacífico, sorriu:

Não há o que se fazer

Custei a dormir, custei a entender

Dia afora vagava priscando, alheia

De noite, gemia , berrava, nem sei

Não deixava ruminar minha nobre cesta

Enchia-me de vinho.

A carabina na estante.

Ela vai ver!

E caia no sono sem nem perceber

Arguto, eu proseava com o João Sombra:

Que besta impertinente e ingrata, vê?

Tem da melhor grama, água e curral

Depois fica ai, parece que agonizando,

Como se a fizéssemos algum mal

A carabina na estante dando-me o sinal

João Sombra, quase sacerdotal, sorria:

Isso passa patrão. Ela se cansa e se amansa.

Vai dar boa lã. E quando chegar o Natal

Na ceia, com seus parentes e tal,

viva e verá

Que dessas amotinadas

Boa carne se dá

Carabina na mão, custei a dormir e a acreditar

O desdentado João, tinha mesmo razão

Trinta dias depois, nem um pio se ouvia

Ela roçava em mim, como se em muita gratidão

Com seus balidos suaves

de grata bela cria

Sereno eu dormia esperando o Natal