Nossos Medos...
Se há medo de uma morte violenta
Façamos um contrato de serviços
E eu me entrego a ela sem pestanejar
Aos poucos e aos sussurros
Estarei disposto em suaves parcelas
Prometo o desígnio do bem morrer
De me lançar ao amor que consome
Às paixões que definham cada dia
Se há horror numa morte sem aviso
Então eu assino o direito
De ela bater em minha porta
Dias antes para que eu me programe
Avise amigos e parentes sobre a viagem
Talvez a última jornada por entre vivos
Acordarei cedo e olharei os lírios do campo
Hei também de assoviar minhas canções
Tomarei meu café matinal
[como de costume]
Meu banho longo e demorado
Quem sabe eu pule a janela gargalhando
[e fujo]
Até que na esquina a ceifadora decida
Se vai me atropelar com um ônibus
Ou derrubar um piano em minha cabeça
Se há medo
Medo do medo
Medo de sentir medo do medo
Então não assino nenhuma concordata
Extinguir-se da vida não é um projeto
Nem uma lei universal do homem
Viverei no pavor cotidiano
Até que quando menos espere
A fatalidade me surpreenda pelas costas
Certa de que ficarei muito satisfeito
De não ter conhecido o fim das finitudes
Nem ter sido decisivo e arbitrário
Sobre quaisquer de seus meios
Se há um medo que fere profundamente
O espírito da existência de cada ser
Não sei dizer se é o de morrer subitamente
Ou o de amar incondicional e mutuamente...