DELÍRIOS DA ALMA
A noite irrompeu na janela.
Aconchegou-se ao sofá.
Queria me beber,
Queria me ceiar.
Estendeu seu olhar amalgamado
A piscar um enluarar ávido.
Passou a língua suada de orvalho
Sobre o cerne de meu peito pálido,
Esquálido, cansado, pendido ao fado.
Deitei-me, tomado, à sesta baldia
Da madrugada feita aos passos
De raios de dentes reluzentes
De intermitentes celestes esguias.
Sem desfeita, fui mastigado...
Primeiro fendi-me em planeta,
Depois fraturei-me em cometa.
Enfim consumei-me em estilhaços
D'um violeta meteoro grávido
Povoado de cristais baços...
Plácido, deixei-me trombar de frente
Com minha estrela-guia
Astro frágil de lastro indulgente
Que, em mim, se esbatia
Pelo céu ruço que se insistia
A banhar-me o dossel vago da mente
Riscado ao espaço, hipérbole cadente,
A treva, carente, nutria
Com as fibras do ser que esgotou-se
A boca-da-noite esfomeada
Que, ardente, desavisada,
Sem suplício ou açoite,
Delirava em minh’alma que dormia.