Origem (Deus Revisitado)
O lugar estava como sempre... Aquele lugar fora do tempo, guardado num estranho vale do cosmos. Aquelas paredes, aqueles símbolos. Tudo tão lindo, tão inexplicável, mesmo para ele, mesmo para o elevado ser de asas que ofuscam o sol com seu brilho de justiça e verdade, mesmo pra esse ser que precede tudo o que é belo, tudo o que é vivo ou morto.
Nas desfiguradas saliências da verdade está esse lugar, o breve luar do infinito, o acalanto das eras, a varanda da eternidade, de onde se vê o passado antes do passado, e o futuro antes e depois do fim. Exalando odores de flores que jamais foram tocadas, num prado onde pés-não-eternos não pisam.
Ouve-se um som distante, mas inacreditavelmente vivo ainda, cheio de vísceras pulsantes, órgãos do infinito corpo, almas do silente amanhecer.
O que ele vê é esse Ser, que juntou as primeiras células como em uma brincadeira de criança, que manipulou cada átomo e cada forma, antes de existir a forma.
Que se banhou em águas que jamais serão tocadas, que perambulou de eternidade em eternidade, no vácuo de uma majestade silenciosa e cheia da dor da solitária e onipotente presença. Essa esplendorosa figura, de onde se originam todas as coisas, mesmo a angustiante e serena falta de compreensão.
Essa doce criança que, num furor divinal, trouxe à existência toda a vida e toda a morte, que criou a inteligência em códigos que só ela mesma decifra.
E ela está ali, sentada, olhando para bilhões de galáxias, os universos distantes, que se abraçam em dor e em silêncio. De seus olhos lágrimas, que como gigantescas quedas d’água, vão correndo pra um chão onde o piso são estrelas, irrigando um jardim que conheceu a vida inocente, que conheceu um tipo de amor que nunca foi entendido.
As sinuosas e escuras cavidades onde se encontram as verdades sobre a vida, sobre esses anjos que foram criados num crepúsculo de amor, de um reino antes dos reinos, que se espargiu pelos universos, deixando partes da totalidade em todo lugar.
Seres que foram braços de seu grande e arquitetônico plano... Nunca foi completamente entendido, nunca foi de verdade amado!
Ergueram altares de pedra, e ouro, e madeira, mas O negaram o corpo, o altar de carne, criado geneticamente pelas mãos do cirurgião da interdimensionalidade, nesse templo chamado “Terra”, jardim do grande amor.
Nesse momento o grande vazio toma esse lugar eterno, de uma beleza que olhos humanos não suportam e que pele humana não toca sem se desfazer...
E ouve-se a VOZ, que deu vida a cada molécula, dizer: "Diga algo pra me fazer sentir melhor, a minha justiça não permite escolhas! Eu imaginei-me senhor de todo o mundo, mas sem muito a fazer, não podendo alterar nada do que fiz porque não posso escolher... Olhando meu rico palácio, anjos que adornam com uma beleza que jamais poderia compor nenhum outro ser! E vendo como rejeitam a serenidade da doce e simples verdade, velada em cada pequeno detalhe de seus mundos... Inventaram credos, até falam por mim... Mas nada são em mim, senão pó-de-estrelas, tirados de um sonho breve, mas cálido e paternal. Eu os dei a vida de tantas formas diferentes, mas preferem aceitar a morte, preferem abraçar o finito, quando deveriam olhar em volta e sentir como a eternidade está perto de cada um, como deixei sinais de uma vida além da vida, que transpassa os sóis, os planetas, os seres de todo canto, e a Mim mesmo! Eles olham para o céu, mas colhem o fruto errado!
O Seu mais fiel e honesto amigo, sentado com essa espada flamejante nas mãos, olhando pra Ele com um amor que jamais seria compreendido... Como que dizendo: Pai, não foi culpa sua!