O SER SUBTERRÂNEO
O ser subterrâneo,
Por convicção, escava, ataca com pás e brocas pesadas as bordas
Das rochas mais profundas, mais solidificadas
Incrustadas nas cavernas mais escuras, sem fundo
Das zonas mais desabitadas e infecundas
O ser subterrâneo
Avança impetuoso, decidido, ao núcleo geocêntrico do planeta
Solapa a base de seus pés, namorando o miolo de tudo
Priva-se de luz, ar, astros e nuvens. Mune-se de inabalável fé
Para manter intacta e sem altercações a superfície de si
Jamais se impacienta ou se exaspera. Erige sua treva particular
O ser subterrâneo
Ignora a floresta das feras, a calota polar, os anjos e demônios...
Incinera os afetos, o vínculo familiar, as emoções incompreensíveis
O que lhe importa de verdade é a profundidade exata da cratera
O que lhe emociona mesmo é a dura arte de escavar sem desnível
Desaparece para o mundo, mágico, livrando rastros de segui-lo até lá...
Não há volta cabível – e nem ele quer - desta atrativa vala de mão única