QUE NOITE !?!

Preciso esmagar essa noite,

besta noite,

que traz uns caracóis roxos.

Ateus,

sábios,

disputam luares sem brilho.

O olhar mais refinado é de um barroco estúpido,

mãos e bocas trêmulas dizem: salve o nada,

é dado o instante fatal,

deliremos num último afã da verdade.

Um velho corvo me espreita à porta da Catedral,

mais adiante, no átrio, solitário, adormece o galo da madrugada,

padres e pastores dançam entre demônios,

não há mais nem gelo nem fogo,

a grande noite, a triste noite, avança como vulcão indomável.

Preciso, sim, esmagar essa noite.

Cervantes e Dante traçaram os arquétipos,

Dom Quixote não é o Leviatã,

o Purgatório é ilusão dos espertos,

moinhos de brasas arrancam memórias,

dilaceram sonhos, turvam reflexões.

Caem dos céus gotas de um sangue espetáculo,

afogam almas,

derretem o sol,

varrem dos Espíritos as canções de Libertação.

Preciso esmagar essa noite.

O José de Drummond se enredou nela,

nem Ulisses,

nem Tirésias,

nem Teseu,

nem coisa alguma,

trazem de volta o que essa noite nos rouba.

Talvez Espinosa,

talvez Nise com suas cartas,

talvez a genialidade de Jung,

talvez a ousadia paulina, possam clarear um pouquinho as veredas.

Preciso, urgentemente, esmagar essa noite,

esmagar essa noite,

esmagar essa noite.