Inventário
Quedo-me sentado, absorto, à beira desse íngreme caminho torto
Contando os anos passados, águas debaixo da ponte de minha história,
Rios de metáfora, canoas pesadas na veloz corredeira de minha memória.
Aqui fico inventariando acertos e fracassos, juntando pedaços soltos.
Não há muito a comemorar, desespero não se guarda no armário, alegrias são passageiras.
Filhos criados já os tenho, netos crescendo também, são sementes da minha vida - renovação só faz bem.
Aqui chegamos sem nada, ao partir só nossas marcas deixamos - desse destino não escapa ninguém.
Tão diferentes na vida, homogeneizados no fim, reis e mendigos irmanados, inimigos conciliados, juntos na paz derradeira.
Neste inventario que faço, coisas ressaltam de pronto, amigos reais, verdadeiros, poucos mais fundamentais,
Amores de vários matizes, todos de suma importância, alguns amores confusos, outros com mais substância.
E a vida segue seu ritmo, independente de nós: tal refletir me assusta, faz-me sentir o que sou - uma casca de noz perdida na ignorância,
Sacudida por maremotos num cataclismo feroz: fruto de conversas atravessadas, angústias mal-trabalhadas em universos ficcionais.
Por mais que se fale e se escreva a respeito sempre me enche de angústia a pergunta: o que realmente tem valor na vida? A resposta vai depender da visão de mundo de cada um de nós, da qualidade do ferramental com que viemos dotados e do uso que fazemos desse arsenal. Tomar consciência de que somos, todos nós, centros do Universo, e que nessa condição de centro estamos a interagir com os demais seres sencientes, também eles centros, é essencial para nosso próprio crescimento evolutivo. Quando visualizo esta reflexão consigo diluir o enorme peso dessa angústia que me avassala.
Vale do Paraíba, noite do terceiro Sábado de Dezembro de 2009
João Bosco (Aprendiz de poeta)