A outra

A palavra se evaporou, como se evapora o perfume d'um frasco aberto, exposto ao tempo.

A palavra se transmutou em sombra e cinzas,

depois de uma fogueira apavorante, alastrada pelos caminhos de ser.

A palavra, agora, é um nada que me possibilita existir...

Mas do nada faço minha morada,

do nada, o cálice de Deus me chama

e concede mais uma palavra, além de infinitas outras...

e mais...

O tempo fez da palavra minha luz,

a vida a fez meu leito.

A palavra é a mãe que sopra uma canção de ninar

e me faz adormecer e sonhar...

A palavra inspiro e expiro, constantemente

Quando expiro, entremeada dos veios mais secretos que carrego...

Um dia a palavra foi nascer, hoje é presente e amanhã, talvez, será inevitável...

Porque não sou eu quem escreve, mas alguém que não sorri.

Não escreve aquela que finge ser, mas aquela que é e se torna, a cada dia.

Quem escreve é a alma que de tanto sofrer pelos outros, resolveu sofrer pela palavra...

Quem escreve não é o véu, é a face escondida,

a flecha desferida, a mortalha sagrada...

Quem escreve não tem nome, mas um dia será eterna.

Eu... Não! Sou humana, imperfeita e tão complexa.

Aquela que escreve não é complexa, ela expõe tudo que há, tudo que é na sutileza da palavra...

É ousada, é tão direta.

Por isso corro, eu, dos perigos que ela dita...

Muitas vezes, não consigo fugir.

A palavra é a própria fuga, é rastro

e pela palavra, ela sempre me encontra.

Ai de mim!

Tenho tantos segredos...

Anna Beatriz Figueiredo
Enviado por Anna Beatriz Figueiredo em 24/10/2009
Código do texto: T1883893
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