Amizade e ausência

Lata vazia jazia num canto

Guardiã dos restos humanos

Solitária, aceita, ajeita os detritos

Suco do nosso suplício

Que como o tempo restrito

Passa e não percebe

Que um dia, nem lata seremos

Serenos, morreremos

Estúpidos amênos

Lixo cósmico

Apodreceremos.

O líquido preso ao fundo

Descansa

O sólido decomposto

Fede

Mistura de um dia

Que como o tempo desperdiçado

Passa e não percebe

Que um dia nem lixo seremos

Estúpidos amênos

Lixo cósmico

Apodreceremos.

Devo lavar meu tempo?

Escová-lo?

Enxugá-lo?

Passá-lo?

Tempo fétido, encardido

De ti sou adido, escravo

Não lavo não!

Me rebelo!

Quero escoá-lo

Num ralo profundo

Afogá-lo!

Tempo que impede

Interrompe e prossegue

Não pede licença

Vai adiante marca

Fere e registra

Como a amizade despista

Dele faz desculpa

-Desculpe, não deu... Não tive tempo!

Ah!, como ele é perverso

Afasta e dizima

Amigos que tive um dia

Preciosos instantes

Que só atentos

Percebem que o tempo

Distancia

A alegria, o afeto e a poesia.

Não tenho tempo....

Nem pra ausência!