DIÁLOGOS LUMPENZIANOS [reformulado e estendido]

“Eu sou o réu e a vítima”

Da miséria vivida e do Caos citadino

Nos porões dos navios, perseguido

Nas naves, partido e aprisionado

Do descaso do Estado

Sou Pó que Pedra se torna morte

Na escuridão da noite ou no quente açoite nos frios dias

Sobrevivo à miséria dos tempos

Nessa fina linha que divide a mediocridade e a criação

Linhas imaginárias e divisas embranquecidas

Nos mares áridos do novo mundo

Em vida que se esfacela em ares

No absurdo

Em caça de mudos

Em Iorubá, Malê e Bantu:

Punhos cerrados,

Murros!

Sou o acaso dos casos mal feitos

O ‘Espírito do Mundo’ e o absurdo que vagueia pelas ruas da República!

Sou a miséria encarnada nos Becos

Vendo tudo do que sou vítima e réu

Na falência da vida...

Ambulante das coisas mal resolvidas

Mãos feias que enfeitam o Capitalismo

Sujo como a abundância de um Sistema

Que me torna réu e vítima

Da hipocrisia descabida

Da burguesia que ostenta

Mão-Branca que me orienta pela devassidão

Sou o silêncio na escuridão

Das finas noites na Caverna

Iluminada das Luzes que nunca ascendem

Na penumbra da multidão de flagelos

O som surdo e seco das moedas e dos tiros

Cheiro de papelão molhado,

Sangue pelo chão molhado

Na cidade permeada de mentiras

Donde me faço réu e vítima

Em castelos quentes de revolta

Que se desmancham com lágrimas de Janeiro

Da Caverna que se ergue em metal e concreto

Tomadas de assalto por Capitães-do-mato

Ofuscada pelos cantos

Pelos contos que se esfacelam na enxurrada

Das chacinas nas madrugadas

Como antídoto...

Saliva que escorre e destila o mais péssimo veneno

No silêncio nas ruas curvas e das elegantes turbas

Que perambulam pelo Caos que se torna réu e vítima

De uma história perdida

Engolida pela Peste

Pura e lentamente, Oblíqua e dissimulada

Nos cantos de tormento que lamento

Pela Barbárie de réu e vítima

Torna-me Peste encarnada

Na pele de Fantoches mortos

Pára vida...

Lumpens, Ratos, Autômatos e Fantoches

Nessa Fantástica Fábrica

Que na enxurrada de egoísmo

Imunda o Caos que se revela na Bonança burguesa

Com véu podre de ostentação

Podridão que nunca padece

Viva e sem refrão

Cheiro e presença que incomoda

Vida que não se percebe

Sou réu e vítima da Barbárie que se torna Peste

Das trancas nos porões que me torna vítima

Da miséria vivida de que sou réu

Silencia a madrugada na Grande Peça

Que se pode chamar Selva

Pode se chamar Morte

Composta de Ratos mortos e Fantoches

Com corpos jorrados nas calçadas

Jogados pelo réu que se torna vítima enquanto Caos inspira-me...

Mesmo assim,

Como réu,

Sigo por aqui,

Até o fim!

E seja como for:

No universo em desencanto

Desemboco no adverso

Por vezes em pranto

Se pá nem

Quando assim canto

Em poesia

Que sai de mim

Pra dizer das angústias

Em rimas pesadas, tortas, confusas,

Nos versos da luxúria

Donde na morte dou fuga

Astuto como a rua me ensinou:

– Seja na malandragem,

Na solidão,

Ou na minha intromissão em trancos nesse universo –,

Sujo em sangue

Quente e pulsante

Páginas amareladas em branco!