Carta à um amigo

Carta à um amigo

Hoje lembrei de você e saí por ai.

Peguei um pedaço de pão e tentei não esquecer do truque das migalhas, mas minha memória já não é a mesma e o caminho possui mais encruzilhadas do que se possa julgar.

Ás vezes não me lembro do pão ou de você. São espaços brancos na memória, mais um buraco na parede.

Ás vezes eu não quero de verdade. Não quero e acredito que é verdade. Mas a verdade é que eu só acredito no que sinto e o que sinto pode mudar. E muda.

E o sol continua a brilhar pelas frestras entre as nuvens e eu continuo a me admirar com a vida, com você, com o mundo.

E mais um dia é riscado no calendário e mais um ano colocado em minhas costas

E mais uma noite sem dormir pensando no mundo, aquecimento global, capitalismo, liberdade.

E mais um dia de trabalho e rotina e mais contas na minha caixa de correio.

E a vida continua a andar em passos largos.

O que você quer ser quando crescer? O que você quer ser quando você já foi e desistiu? O que você pode ser quando você nao consegue escolher? Quando você muda de idéia e começa de novo?

Que tipo de adulto me tornei?

Nunca pensei que poderia me tornar a piada das crianças do bairro. Você nunca acha que vai acabar assim, mas ás vezes, olho no espelho e nos ladrilhos do caminho da minha vida, e olho o mundo em minha volta, e penso que a possibilidade não deve ser descartada.

Você pode se atrever a desistir do mundo, mas e o mundo, ele quer desistir de você?

E você senta e espera que um dia ele mude com você, e passa mais uma noite sem dormir sonhando acordado com todas as coisas que você quer fazer e com a vida feliz que vai ter quando crescer.

E esconde sua identidade embaixo do colchão e joga fora o calendário e tira a pilha do relógio.

Mas eu insisto com minha mania de acreditar em todos os planos malucos que fizemos.

E continuo com saudades de todas as coisas que não fiz, e dos lugares que não visitei e das pessoas que não conheci.

E me entorpeco pra esquecer da angústia que sinto toda vez que lembro que um dia vamos morrer. E que a vida é curta e a sorte esta lançada toda vez que abro meus olhos pela manhã.

E certas coisas nunca mudam e toda regra tem sua exceção e os clichês ainda funcionam muito bem.

E minhas dores de cabeça aumentam quando penso nas contas, nas escolhas e na minha constante indecisão.

Poderia fazer uma lista das coisas que sei que não quero fazer, já que não sei o que quero, mas você sabe que não sei falar não.

E não consigo lembrar o que esqueci de trazer, e esse sentimento de que algo esta faltando permanece.

E finjo que não ligo quando as pessoas não me entendem, e finjo que não vejo que as coisas não são como deveriam ser.

E a vida vai passando, as pessoas saindo e chegando. E mais um drink, um dope, um novo personagem na história.

E você meu amigo, como vai?

Liége
Enviado por Liége em 03/06/2009
Código do texto: T1630862
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