DOIS LADOS, UM DOENTE
Os talheres de prata sobre a mesa
Entre os vinhos e finos cristais
O linho branco enfeita o jantar
Que alimenta os mais descansados.
O outro lado da parede esconde
O quarto sujo que o luar invade
No canto o cão dorme esfomeado
Como a vigiar um grande segredo.
Aroma de flores e som de violino
Recebe os sabores da boa cozinha
Olhares atentos e mãos preparadas
Degustam o medo que bem criam.
O latido fraco sugere o final da vida
Outro suspiro ao seu lado ressoa
Um homem tão cão quanto pessoa
Dividem a solidão indefinidamente.
Nos restos de jantar a lembrança
Uma mesa composta de vazios
Entre a vergonha da fome vizinha
A certeza de saber-se igual na morte.
Se no corpo carrega toda a beleza,
Composta pelo que de melhor se viu.
Vê-se que entre as duas naturezas,
É essa a doente que jamais serviu.