TALVEZ A CULPA

Poema baseado na bela poesia da Sónia Neves

TALVEZ A CULPA

Seja do ar

Que mal sei respirar

O ar inspira-me a ternura

De tempos

Que teimo em desperdiçar

Talvez a culpa

Seja de um amor

Que sem pedir bateu à minha porta

Temia que fosse um ladrão

E por isso sai pela janela

Batendo-a com um enorme estertor

Na dúvida plena

Daquilo que sentia

Mas que não sabia sentir

Porque tenho a dúvida suprema

De por vezes existir

Tal é o tremendo paradoxo

Do que escrevo é pura vida

Do que vivo tem-me seguro pelo pescoço

A pedir para aproveitar

Todos os momentos fora da literatura

Porque para além do papel

Também há ternura

Embora eu o saiba

E esteja sempre a hesitar

Porque no papel

As coisas possam-se sempre endireitar

Ao passo que na vida

Há coisas que morrem

Há coisas que têm um fim

E nada podermos fazer

A não ser o luto

Que sou incapaz de fazer por mim

Embora acredite numa nova aurora

Estou sempre a acreditar

Único objectivo claro dessa vida

Pela qual irei até ao fim lutar