Mestra


A Mestra era tão pura. " Os bons trabalhadores
destes campos sem fim que assim os fez Jesus,
são puros nos olhos, nas mãos e nos amores
como claro é o azeite que dá clara luz."

Tão pobre era a Mestra. Seus reino transcendia
ao terreno poder. Como o reino de Deus.
Usava roupa humilde. Anéis não possuía.
Do espírito o tesouro era todo seu.

A Mestra era alegre.Pobre mulher ferida!
Fez do riso o segredo de chorar bondade.
Sobre a alpercata rota, quase destruída,
erguia-se, intocável, flor de santidade.

Doce mulher em cuja fonte de ternura
dessendentavam-se à larga, os tigres da dor.
O ferro que a feria, eivado de amargura,
mais amplas desvendava as jazidas do amor.

Ó, campônio, teu filho com ela aprendia
a canção e a prece. Nunca viste o fulgor
veemente e cativo que em teu filho ardia
e beijaste, sequer, seu coração em flor.

Entretanto, mãe-carne, quantas, quantasvezes
com remoques brutais retribuíste a lição!
Ao afago da Mestra - mais que dos teus revezes,
leva teu filho a herança em pleno coração.

O arado retalhava em funda lavradura
e eis que a semente germinou em pura perfeição.
Da modesta virtude, sua fronte a brancura
ungiu. Ó campônio, não lhe pedes perdão?

Dava sombra de selva sua fronde materna
no dia em que a morte convidou-a a partir.
Se a mãezinha a esperava lá, na paz eterna,
por que a morte ela iria agora resistir?

E repousou em Deus como em coxim de lua,
Por travesseiro teve uma constelação.
O Pai acalentou a filha que era Sua,
de paz abeçoou-lhe o terno coração.

Transformou-se-lhe a alma em veio de pureza
para a sede abismal dos órfãos da esperança.
E a vida que viveu com luta e beleza
ficou como um roteiro que ao futuro alcança.

E afora, no pó dos seus ossos se alimenta,
na tumba, o vermelho incendiado dos rosais.
Conta-me o zelador que a seiva mais se alenta
ao cantinho onde jazem seus restos mortais.
Flávia Melo
Enviado por Flávia Melo em 08/03/2009
Reeditado em 08/03/2009
Código do texto: T1475384