Buscando a poesia
Disseram ao poeta: ‘revela-te!’
exponde teus medos, desnuda-te, confessa!
então ele rasgou o peito em praça pública
fez verter sangue, atirou ao chão os sentimentos
à vista de todos,
escancarou feridas,
abriu os braços
como quem diz ‘estou aqui, descubram-me!’
mas não o quiseram
para eles ele era redundante, incômodo, monossilábico,
para eles ele era o choque, o tapa no rosto, o antipoeta
queriam um parnasiano recatado, um modernista nato,
alguém que lhes afagasse a mente
mas não um desafinado irritante, verborrágico
não alguém que dissesse que o amor agoniza,
a esperança despenca
e a felicidade titubeia em versos,
disseram ao poeta: Luta por nós!
Arrebata nossos exércitos com teu versejar!
Mas o poeta abominou o nacionalismo vil
as bandeiras encharcadas de sangue
e falou de si mesmo
dos abismos infinitos em si mesmo
das buscas a seres perdidos dentro de si mesmos
de homens gigantes como estátuas
mas com corações de barro, frágeis,
para todos, ele era um quase poeta
que fingia ser na verdade um poeta,
para em segredo buscar nos seus próprios mundos obscuros
a inseparável, contagiosa e desesperada
poesia.