PÓLENS DEGENERADOS
“Ah, monstruosidades chorando seu manto!
Troncos dignos de máscaras, ridículo, desnudos,
Pobres corpos torcidos flácidos ou ventrudos,
E que o útil Deus sereno e sem cansaço
Logo à infância envolveu em tristes cueiros de aço
E vós, mulheres, aí lâmpadas funerais,
Que à podridão corrói, vós, virgens que levais
Do vício maternal a hereditariedade
E todos os horrores da fecundidade! “
Baudelaire
“E por se multiplicar a iniqüidade,
o amor de muitos esfriará”
Mateus 24:12
“Não! Não era o meu cuspo, com certeza
Era a expectoração pútrida e crassa
Dos brônquios pulmonares de uma raça
Que violou as leis da Natureza”
Augusto dos Anjos
Da edênica imagem, decadência,
E da pureza à pornografia,
Da beleza in natura à falsa essência,
Da espontaneidade à hipocrisia...
Do verdadeiro amor ao interesse,
Do carisma ao caos imediato,
Tudo esmorece então; definha, vê-se
Um anacoretismo avante – é fato...
A moral se corrompe velozmente,
As leis da Natureza, violadas,
Epicurista, à moda, é ser somente,
Medusa às almas são petrificadas...
Um horroroso e hediondo hedonismo,
Que até Narciso inveja e reivindica,
O trono outrora seu... Vai-se o lirismo
E a compaixão da alma se abdica...
Esgota-se o amor real – sincero,
E a verdade vai desvirtuada
E uma ansiedade – um desespero –,
Trazendo essa amargura à caminhada...
Os laços de famílias são rompidos,
Há sempre um novo abuso – novo incesto –,
Os matrimônios já não mais são fidos,
E forma-se um novo manifesto...
Tanta pedofilia corre solta,
A vida é mais barata que um centavo,
Tanta perversidade que revolta,
Que pra viver, precisa de ser bravo...
É matri-homi-frati-sui, parricídio,
Uma selvageria abundante,
Só dolo e enganação e infanticídio,
E a promiscuidade segue avante...
Jesus está anêmico – exangue –,
De tantos sanguessugas e vampiros,
Venderem, leiloarem, o Seu sangue
A tolos sacrifícios e suspiros –
Suspiros de ilusão d’um céu aquém –,
E cada dia aumenta mais o caos,
E o Paraíso ofusca-se além,
E vencem mais corruptos e maus...
A esperança morre a cada dia,
A vida torna insignificante,
O dolo, a enganação, hipocrisia,
Vai dominando rápido – num instante...
É tudo tão normal ultimamente,
O que era então contrário, hoje não mais,
Devora-se a si mesmo – sua semente –,
Qual Cronos aos seus filhos, tão voraz...
No ar tantos venenos respiramos,
E aos alimentos, manipulação,
E a ética, ao ralo, vai-se aos anos
De cada descoberta desde então...
E ao paladar, aroma e conservantes,
Que a essência in natura não é sentida;
Às plantas, agrotóxicos – abundantes,
Será que ingerimos mesmo, vida?
Então nascemos já degenerados;
Enfermos, decadentes, carcomidos;
E alguns neurônios falhos pelos lados,
E outros sentimentos corrompidos...
A imagem e semelhança do Eterno,
Só resta um rascunho assim mau feito,
E uma saudade aquém ao peito ermo,
Que mais e mais se torna o eleito...
É triste de dizer, vejamos nós, que
Possuímos a bendita consciência,
Mais reles que qualquer verme do bosque,
Há muito se perdeu a referência...
E assim que nascem crimes horrorosos,
E a Fúria e a Discórdia são as musas
Que inspiram quais perfumes venenosos
Sandices sem vergonhas e sem luvas...
A treva cobre Terra lentamente,
Da Luz vai se afastando a Humanidade;
E nesse lusco-fusco, cada mente
Enferma, a paz procura e tem saudade...
Nos peitos há o tédio que os consomem,
Descobre-se, então, a realidade:
Maior que o Universo, em cada homem,
Buraco negro qu’há da vacuidade...
09/04-26/10/08