O SER DA COISA E O SER DA PESSOA
Quando fixo os meus olhos no Nada
e começo a tentar entrar em Seu espírito
me vejo perseguir a tristeza ideal:
A qualidade de ser indiferente
com as coisas, que o são, e, por isso, naturais...
Entre as coisas impera uma impenetrabilidade
Entre as pessoas, porém,
uma vulnerabilidade da qual não se pode escapar.
Meu corpo inteiro se fecha em espírito
como a blindar-se em vão do que é vão.
Umas nas outras as pessoas entram
invadem sem pedir passagem
fazem-se temer e temer-se mutuamente.
O medo não é Coisa que toma conta
mas idéia, corolário de nós que lidamos com gente.
As pessoas inventam o medo
e representam-no em figura, osso e carne.
As pessoas inventam o cedo e o tarde
o certo, o errado... As pessoas Criam o absoluto
e suplantam a, passam por cima da, sua eterna relatividade.
São, as pessoas, seres que são pelo que escondem.
Ora, sou, para meu próximo, o que ele consegue ver.
Se o faço ver o que quero que veja
escondo o que à sua vista minha alma não deseja.
Somente por me esconder é que consigo ser.
Isto, uma vez que, para as pessoas, o ser está fora de si,
está no outro. Sou para quem me viu, ouviu...
não sou para quem nem sabe que existo.
Sou, deste jeito das pessoas, relativamente:
um número para uns; um inimigo, para outros.
Vive, a coisa, aquela harmonia indiferente
de saber ser por si e não invadir o ser do outro
tampouco lhe ministrar absolutos, dogmas, ditames.
É, a coisa, como tal, indiferente às outras...
Que, porém, sabe serem, mas por si; ainda que delas nada soubesse.
O Nada é a coisa que é nenhuma coisa por si.
É, o Nada, ele mesmo sempre ainda que dele nada se diga.
Contudo, se se diz nada, dele se diz tudo.
O Nada é ausência de ser; mas se É, como não ser?
Ele, sendo, é absoluto. Relativo é o que dele nós inventamos.
Quando fixo meus olhos no nada
fito a verdade gritante, desesperadamente calada...
Fito a aparência do que não se quer fazer parecer
mas apenas é por nada esconder.
Desejo eu ser a coisa Nada sempre, e não ter sido pessoa jamais.