A SOFREGUIDÃO DO NÃO-POETA

A SOFREGUIDÃO DO NÃO-POETA

Quero ser um artesão de palavras:

Duras, dúcteis, viscosas, herméticas,

Diáfanas, sinceras, profundas, singelas, iluminadas.

Eu quero é ser poeta

Pois este erige contínuas miríades de estrelas

Sobre o céu de eternas noites enluaradas!

Quero poder afluir,

Quando me der na telha,

Ao feérico lago da espontânea

Língua do povo:

E, ao libar da sua água,

Expelir-lhe as impurezas,

Que são as chagas, as mazelas,

O carcereiro da igualitária opulência,

Para deixar que viva livremente

O florescer incontinenti

De castelos e mais castelos

Da alacridade e dos felizes sortilégios

Que emanam do eufemismo

Da escrava gente.

Quero degustar

O vinho tinto da galharda palavra

A fim de homenagear a imponência

Que cimenta os mínimos e máximos halos

Da natura realeza.

Quero ser condigno

Quero ser acuidade e sageza

Quero ser humildade, vivacidade, gentileza

Quero ser feiúra e esbelteza

Quero ser a inane importância

Quero viver perpetuamente

[ No jucundo reino

De ingenuidade

Das crianças

Quero ser ventania, poesia, proximidade, distância

Quero ser o instante

[No qual se encerra o segredo

Da segurança, da solidão, da tristeza,

Do medo, da coragem, da alegria,

Da repreensão, da recompensa, do desejo

Quero ser a imensidão

Quero ser pequeneza

Quero ser a imperfeição em evidência

[Pois a perfeição

É um atroz sofisma

Da humana cabeça

Quero ser a multidão

Quero ser o átrio do sol solitário da certeza

Quero ser a rocha, a rosa, o rouxinol, o girassol, a orquídea, a açucena

Quero ser a ametista, poeta em perene florescência!

JESSÉ BARBOSA DE OLIVEIRA

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