OS MEUS

Os meus

Sou jantar de mesa farta,

Três noites de forrozada,

Alegria de matuto,

Cantador de embolada,

Sou filho da nuvem cheia

Que concebe a invernada.

Meu companheiro é trovão

Famoso pai da coalhada;

Meu mar é açude velho

Em tempos de enxurrada.

Minha mulher é a lua

A passear pelo céu,

Sem batom, perfume ou ruge,

A roupa somente o véu

Daquela nuvem branquinha

Amiga do menestrel.

Quando o sol está dormindo,

Ela começa saindo

E, sempre a se insinuar,

Acorda os noivos poetas

Para a vida versejar.

O meu filho é o sorriso

Das crianças desprezadas

Quando encontram o paraíso

Nos braços de uma mãe amada.

A ele dou leite e pão

Farinha, cuscuz e pirão

Ribacão e carne assada,

Mesmo que não peça nada.

Imensamente feliz

Eu fico quando ele diz:

- Papai -, e dá uma risada.

A minha família é o povo

Que planta e milho e feijão,

Que acorda às 5 horas

Pro mode ganhar o pão,

Que parece uma sardinha

Espremido em condução,

Pedaço de mamulengo

Caindo da construção;

Que apanha do bandido,

Da polícia e do patrão.

Quem sabe em minha casa um dia

Num sarau de poesia

Vamos ter revolução.

(Luanda, Angola, 10/07/2006)

Miguezim de Princesa
Enviado por Miguezim de Princesa em 27/05/2008
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