Diálogo entre o Mestre e o Aprendiz

Elias dos Santos: A arte liberta a ideia e aprisiona as cores.

 

Aprendiz: Quem sou eu para dizer o contrário? Mas... eu, que cultivo a liberdade, gosto de pensar que as cores estão livres, já que se tratam de impressões provocadas pela luz nos olhos de quem vê.

 

Elias dos Santos: As cores da luz estão livres, sim; as cores pigmentadas encontram morada nos espaços provocados pela arte, para assim virar poesia.

 

Aprendiz: Então, nasce a poesia de uma cor aprisionada pela arte? Ou o seu amor pela arte aprisiona a poesia?

Elias dos Santos: De cada cor que se encontra, novas cores vão nascendo e o pincel da imaginação mistura todas, e voam nas asas coloridas das borboletas.

 

Aprendiz: Chego a imaginá-las, poeta! Agora, entendo: a arte aprisiona as cores nessa linda tela que acabou de criar para dar liberdade à poesia que flui na minha imaginação.

 

Elias dos Santos:

Sorrindo pra primavera

Nada será incolor

Pinto palavras poeta

Risco as frases de amor

Viajo no colorido

Pinto as telas do pintor.

 

Aprendiz:

Sorria para o inverno

Que também refrata cor

Pois rima com água doce

Na mesa do agricultor

E anda na tempestade

Sabendo que esta fase

Também tem o seu valor.

 

Agora pinta na tela

As flores da primavera

Exibindo suas folhas

Numa linda aquarela

E me diz se o inverno

É um ciclo paralelo

De uma doce primavera.

 

Elias dos Santos:

O boi passa na cancela

Leva estrume do curral

Pisa a grama verde claro

Num domingo matinal

E um beija-flor colorido

Vem brincar no meu quintal.

 

Acho belo um sagui

Carregando o seu filhote

Uma velha na cacimba

Com pressa enchendo o pote

Uma moça colhendo flores

Um bode dando Pinote.

 

Aprendiz:

 

O rio azul-turquesa

Que corre perto do monte

Banhando menino sujo

Que brinca de esconde-esconde,

pega-pega e baladeira

acertando de primeira

a linha do horizonte.

 

Elias dos Santos:

Admiro um passarinho

Tomando banho de areia

Tal qual uma semicolcheia

Vai andando de pulinhos

Mas, por ser pequenininho

Não existe atrapalho

Pulando de galho em galho

No seu trabalho sozinho

Vai arquitetando o ninho

Como um mestre do baralho.

 

Aprendiz:

A família de porquinhos

Se banhando em lamaçal

Para dar um colorido

Neste quadro imperial

Eu contemplo a beleza

Dessa linda natureza

Que envolve o meu curral.

 

Elias dos Santos:

Cem formigas carregando

A pena de um pavão

Uma lagarta de pelo

Come a flor de malvão

Um Guiné passa correndo

Por cima da plantação.

 

Aprendiz:

 

Colho em versos as sementes

Que plantei no meu terreiro

Manga, umbu, caju e jaca

Frutos doces do celeiro

Os meus olhos saboreiam

Minhas palavras sombreiam

O cenário hospitaleiro.