Era uma vez um vale
Era um vale silente ao pé da serra,
onde corria suave o rio das almas,
nas noites vagas de minha terra,
onde estrelas soturnamente calmas,
pareciam vaga-lumes a espalhar,
brilhos na paisagem, matizando,
como pares de olhos a nos olhar,
nos seguindo, seguindo e vigiando.
É neste vale pleno e todo florido,
onde o sol ilumina com esperança,
um tapete belo de rosas colorido,
onde a luz pálida desce e descansa.
Foi num tempo, hoje bem distante,
já vai longe, muito longe esta façanha,
desceu da montanha um visitante,
com uma intenção muito estranha,
e, neste vale, uma cidade plantou,
e foi crescendo e o vale sumindo,
casas, ruas, praças, tudo se espalhou,
e o matiz da vida, vindo e colorindo,
do vale foi seguindo seu caminho,
entre veredas e no sertão chegou.
Então, a vida caminha desordenada,
numa atmosfera de aspecto adurente,
e o vento vem da montanha abrasada,
brando e quente pelo bosque já ausente,
sem as flores espalhadas como olhares,
velando noites estreladas no firmamento,
daquele céu que refletia os mares,
olhando o vale em seu exaurimento.
Foi-se da montanha a luz do vaga-lume,
o vento brando e silvestre já não declina,
além, uma luz frouxa, brilha em seu cume,
triste, numa cortina cinza da neblina,
que se espalha sobre a cidade iluminada,
que se espalhou crescendo até o mar,
e do vento silente, no vale, já não há nada,
que do verdor de outrora se possa amar.