Bem-te-vi

Por Nemilson Vieira (*)

Cantante, saudável, galante nos seus voos mirabolantes...

Vivia um certo bem-te-vi num bairro a coletar os insetos que via pelos ares, juntamente com outros tantos pássaros...

Depois de degustar as suas iguarias preferidas, bezouros, mariposas, libélulas... Descansava agradecido, nos galhos das árvores, nos fios de luz, pelas ruas e áreas verdes da cidade.

Alegremente, vivia feliz da vida, pela barriga farta que ostentava!

Não se cansava de cantar, a bater na mesma tecla: bem-te-vi, bem-te-vi...

Não enfadava-me de ouvi-lo.

No seu cantar parecia dizer boas palavras: “bem-te-vi". Isso deu-lhe o nome popular que hoje possue.

Pudera eu ainda ouvir por muito tempo, o seu cantar, no repertório de sempre!

Seria bom imitar esse pássaro nas nossas relações humanas; no sentido de jogar as pessoas para cima; ecoraja-las.

Senti pelo passamento dessa ave vitimada, caída na pavimentação urbana!

É provável que, ao transitar pelas vias públicas, um motorista no seu veículo, não ligou em machuca-lo ou, por um mal súbito.

Ao lhe ver caído, aderido ao asfalto quente, pelos muitos pneus a lhes esmagarem doeu-me, por aquela vida que se fora! Depois de viver o seu tempo a dizer que, bem via as pessoas, no seu cantar diário.

Interroguei-me: - pode fazer-se poesia dum pássaro morto, esmagado, atropelado inúmeras vezes?

- Pode sim! Fora a resposta mais urgente que me veio à mente, naquele instante.

A poesia não morre, vive impregnada nas coisas... Não se desgruda por nada. Está explícita nas palavras que engenhamos, e expomos ao mundo; se mostra até mesmo num corpo inerte qualquer, desfalecido, dilacerado, moído...

A poesia parece amar, ser vista, sentida, dita, repetida.

Uma vez compreendida pelos olhos do intelecto e pela sensibilidade da alma deseja ser compartilhada, perpetuada...

Ao precisar, não devemos deixar de dizer: graças a Deus, estamos bem! Como o pássaro que vive a repetir no seu refrão.

Ao lembrar-me deste bem-te-vi, vitimado pelas circunstâncias do viver, logo conforto-me. Remanescentes da sua espécie falarão a mesma língua, repetirão um mesmo dizer na sua canção característica.

Desejei ao bem-te-vi que se fora para a eternidade das aves, um merecido descanso!

Eu ainda exposto ao perigo nesta vida efêmera, continuarei a ouvir o seu cântico animador, na voz de outros bem-te-vis.

A letra, a poesia e a graça do teu cantar me faz bem!

*Nemilson Vieira

Acadêmico Literário.

(16:07:19)