Servi, De Vida

Eu, eu mesma que tive meus galhos arrancados

Eu que, do chão, de minhas raízes, fui tirada

Já servi de adorno, enfeite, de alimento

E para aumentar o sofrimento,

Servi de acento,

Berço para o pobre rebento

Servi de luxúria

Servi para ti escrever suas lamúrias

Servi do que se serve

Servi para palitar os cálcios e minerais

Servi para te levar de um lado ao outro do cais

Eu ? Pra que tenho vivido ?

Pra que tenho servido?

Eu que encho seu pulmão de vida

Tenho sido jogada, maltratada, quebrada e humilhada

E por fim esquecida

Sim, esquecida,

Não como mobília antiga,

vintage,

Descolada o suficiente para ser exibida,

Não, não, tenho sido tratada como lenha

Como um simples carvão,

Já não sou responsável por tua escrita

Já não carrego tuas palavras em meu corpo

E já não me confias tua sucessão

Não sou nem um pobre livro aguardando para ser lido.

Para que tenho servido então?

Pra que eu tenho servido?

Já não sou perfeita te enchendo de vida ?

Já não me sente a pleno pulmão?

Me digas então?

Servi ? Oque é servir?

Se encaixar em algo e não sair?

Pra que eu tenho servido?

Para disfarçar esse cinza poluído

Que vocês todos fingem achar bonito

Apenas para ser incluído no clubinho,

Do bobo desorientado, até o ignorante de gentil disfarçado

Todos vocês,

Vão ser a piada da vez

Quando o ar lhe faltar

O pulmão fraquejar

E eu? Eu não estarei mais lá,

Não... Não outra vez

Me cubra de terra...já se foi minha era

Quem sabe essa garotada verde,

Ainda enraizada

Viva melhor que eu e não se deixe ser cortada

Não forneça ar a quem vai te transformar em um item de decorar

Olhe bem pra mim

Que triste esse meu fim

Pra que eu sirvo então?

De ar,

Bela esverdeada, me tornei lenha queimada

E pelo ar que um dia criei

Em fumaça e cinzas vou me desfazendo

Me arrependo

De ter dado vida a aqueles que me levaram ao fim

Quem sabe amanhã eu volte,

Como tempestade ou como praga

Ou até mesmo como a própria humanidade

Para me livrar de quem se livra de mim

Mas deixemos para amanhã minha nova jornada,

Hoje só lamentarei,

Angustiada derramei chuvas de tristeza

Por terem me tirado toda beleza

Por terem me matado

E de meu rebento ter se alimentado

Mesmo que os meus galhos, os meus frutos

Eu ter lhe dado de bom grado...

Você preferiu me fazer sofrer

Me obrigar a sentir a perda

Então hoje, por hoje se faça chover

Amanhã... Voltarei com o novo amanhecer

Servirei como a própria vida, como deve ser

Da semente a árvore crescida

Que chova essa despedida

Amanhã serei um novo ser...