NA SOMBRA DA TARDE
NA SOMBRA DA TARDE
Na sombra da tarde
o pássaro
(após o pouso instantâneo sobre o fio
de energia elétrica),
faz um mínimo cocô.
Fazer cocô sobre o fino fio,
é um dos gestos prediletos do pássaro;
que nem se importa
com um suposto pudor
(e pássaro tem pudor ou outro
sentimento, ou age só pelo instinto?!)
caso alguém o visse evacuando,
sem nenhum medo
de eletrocutar-se.
Prestes a voar,
olha pra um lado, pra outro,
talvez pressentindo o pôr-do-sol,
pela sombra da tarde
que cresce,
e envolve as coisas
num limiar de escuridão.
Num gesto habitual ele coça-se,
agora inquieto,
pois é hora de recolher-se num galho
de árvore qualquer,
num sono reparador, cuja noite,
para ele, chega mais cedo.
O vento
de final de tarde balança o fio.
O pássaro assusta-se.
Faz mais um diminuto cocô
e não o vê caindo sobre a cabeça
de um transeunte.
Por fim, voa, talvez com algum
pudor instintivo.
Adilson Fontoura