POEMAS EM DEFESA DO RIO PARAÍBA

O RIO DA MINHA ALDEIA

O Paraíba do Norte

É o rio da minha aldeia.

Outrora tão caudaloso,

Tão valente e poderoso

Quando ele dava uma cheia!

O Paraíba do Norte

É o rio da minha aldeia.

Onde eu pescava piaba,

Tilápia, camarão,

Fazendo poços no chão,

Brincando na sua areia.

O Paraíba do Norte

Tinha água boa, consumida,

Foi rio cheio de vida,

Foi palco da minha lida,

O rio da minha aldeia.

Mas agora está morrendo

Por ganância desumana

Que no seu leito campeia.

Como posso ter conforto?

A saudade faz-se o porto

Do rio da minha aldeia!

RIO PARAÍBA DO NORTE

Quem foi que arrancou suas plantas das margens?

Quem enfiou essa draga em seu peito?

E quem carregou toda areia do leito,

Deixando-lhe assim, quase uma miragem?...

Sinto saudade da bela paisagem,

Do rio caudaloso, puro, perfeito.

Até que o homem se achou no direito

De lhe destruir, qual louco selvagem.

Rio Paraíba da terra do Norte,

Outrora tão cheio, tão bravo, tão forte!

Hoje tão frágil diante de mim...

Onde eu menino, banhei-me em suas águas,

Pesquei camarão, piaba e tilápia...

Hoje moribundo... Será o seu fim?!...

O RIO

O rio era para o pobre

A esperança de pão:

Batata doce com peixe,

Aipim com camarão,

Tudo colhido no leito,

O milho, a fava e o feijão!

O rio era para o pobre

Vazante pra criação,

Onde pastava suas vacas

Comendo capim no chão,

Onde criava suas cabras

Quando chegava o verão.

O rio era para o pobre

Lugar de recreação,

Onde as crianças brincavam

Co’ a maior satisfação!

Jogando bola na areia,

Fazendo poços co’ a mão.

Mas a ganância dos ricos

Achou-se a Dona Razão,

Cercando-o todo de arame,

Sem aceitar invasão,

Deixando o pobre de fora

No tempo da assolação!

Então o rio que era do pobre

Tornou-se só do ricaço,

Do fazendeiro egoísta

Que tomou conta do espaço,

Extraindo a areia do rio,

Vendendo em máquinas de aço!

Agora o rio é do rico,

O pobre não tem mais vez;

Não pode pescar piaba,

Pastorear sua rês,

E se atravessar a cerca

Leva um tiro, dois ou três!

O DONO DO RIO

O dono do rio

expulsou todo gado,

as lavadeiras de roupas,

os plantadores de batatas,

os jogadores de bola

e dominou todo rio.

Prendeu suas águas,

deixou só um fio.

O Dono do Rio

montou um areeiro

para vender areia

por muito dinheiro.

É caçamba saindo,

é caçamba chegando,

e o Dono do Rio

muito mais enricando!

O dono do Rio

construiu mansão,

comprou fazendas,

comprou muito gado,

mas o rio — coitado!

Só foi afundando,

a cada dia sumindo,

a cada dia minguando!

O Dono do Rio

com seus dragões mecânicos,

com sua ganância infinda,

quando menos esperar

ele vai descobrir

que a areia acabou,

que tudo findou,

que a natureza vingou.

O Dono do Rio

um dia verá

que nada é para sempre,

que não é dono de nada!

Que a justiça da terra

pode até ser comprada,

mas a justiça divina

ela vem e não tarda!

DRAGÕES MECÂNICOS

Os dragões mecânicos

continuam a cavar,

vão cavando noite e dia

na ribeira do Pilar.

Vão deixando o Paraíba

num desarranjo sem par,

quase sem leito e sem vida

pro areeiro enricar!

As caçambas carregadas,

continuam a transitar,

com seu peso exorbitante

pelo Centro do Pilar.

Afundando os calçamentos,

também casas a rachar,

vai quebrando os monumentos,

patrimônios do lugar!

Cava, cava o areeiro,

cava, cava, sem parar!

co' ambição de mais dinheiro,

sempre, sempre, conquistar.

E as caçambas, dia inteiro,

afundando o meu Pilar!

Mas o povo ele é guerreiro,

não para de protestar,

perguntando o dia inteiro:

a justiça onde é que está?!...

Pra que valem tantas leis

se não fazem vigorar?

A AMBIÇÃO DOS AREEIROS

Na cidade do Pilar

Já virou monotonia,

É na calada da noite,

É no barulho do dia,

Mais de 60 caçambas

Passando na nossa via!

Afundando os calçamentos

Das ruas, sem consertar,

Deixando as casas antigas

Com risco de desabar,

Provocando rachaduras

Quando estão a transportar

As areias do Paraíba

Pra vender noutro lugar,

No estado do Pernambuco,

A rota mais popular,

E até pro estrangeiro

Escuta-se o comentar.

Degradando muito mais

O rio que nos servia,

Que nos dava mantimento,

Dia e noite, noite e dia,

Com peixes e camarão

Sempre à nossa serventia!

Mas agora os areeiros

Co’ as empresas de extração

De areia mecanizada

Só nos trás destruição,

Deixa o leito poluído,

Deixa o rio em erosão!

Mas pra eles o que importa

É suprir suas ambições;

Colher o que não plantou,

Encher os seus caminhões,

Degradando o Paraíba

Pra ganhar os seus milhões!

O RIO PARAÍBA AGONIZA

O Rio Paraíba agoniza,

Sem fauna, sem flora,

Sem vegetação arbórea,

Em meio a degradação,

De um novo empresariado

Que faz manobras jurídicas

Para obtenção de licenças

Para mais extração de areia.

O Rio Paraíba agoniza,

Enquanto montanhas de areia

São extraídas de seu leito

De forma mecanizada

E transportadas

Por muitos caminhões

Para outros estados,

Na calada da noite.

Na calada da noite,

E no silêncio dia,

Os proprietários

Se ‘adonam’ do rio

E fazem com ele

Tudo que querem.

Proíbem os ribeirinhos

De desfrutarem

Da bondade do rio:

De tomarem banho,

De plantarem batatas,

De pastorearem seu gado

No leito do rio.

E cercam o rio,

Aprofundam o rio,

Enlarguecem o rio,

Destruindo a mata ciliar,

Sem preocupação alguma.

Tudo em nome em nome de quê?

Tudo por causa da ganância,

Tudo em prol de mais dinheiro.

Mas quem se levantará

Contra a sanha dos areeiros?

Sim! Quem se levantará

Contra a fúria dos areeiros,

Para protestar,

Sem medo de bala

Que venha matar?!

Será algum velho?

Algum moço? Menino?...

— Lá vem Joserino!

— Lá vem Landoaldo!

— Lá vem o Fórum do Rio Paraíba!

Quem mais se levantará,

Nesta terra do Norte,

Para socorrer

O Paraíba da morte?!...

AQUELE RIO

Aquele rio impetuoso

Que passava no Pilar,

Aquele rio caudaloso,

Que prosperava o lugar,

Trazendo vida, renovo,

Pro ribeirinho, pro povo...

Aquele rio... onde está?

Onde está aquele rio

De meu tempo de menino,

Diferente desse fio,

Neste solo nordestino,

De água pouca, a circular?...

Com máquinas no seu leito,

Arrancando de seu peito

Areias para exportar!

Oh, Paraíba do Norte!

Quem decretou tua morte

Neste solo brasileiro?

Rio preso, encarcerado,

Dia e noite saqueado

Por ganância de dinheiro.

Quando serás libertado

Do poder dos areeiros?!...

Ribeirinhos, defendei,

Trazei de volta ao Pilar,

Aquele rio de outrora

Que prosperava o lugar!

Aquele rio vigoroso,

Que seguia, majestoso,

Livremente para o mar!

LÁ VAI O RIO

Lá vai o rio! Lá vai o rio!

Seguindo o seu desafio

De seguir d’encontro ao mar;

Enfrentando seus labores

Pra suprir os moradores

Das terras onde passar!

Lá vai o rio! Lá vai o rio!

Na invernada ou no estio

Levando seu suprimento

Para o pobre morador,

Como um pai que é provedor,

Que oferece seu sustento.

Lá vai o rio! Lá vai o rio!

Outrora forte, bravio,

Impávido e soberano;

Agora tão limitado,

Poluído, saqueado,

Pelo próprio ser humano!

Lá vai o rio! Lá vai o rio!

Sucumbindo ao desvario

A ganância do areeiro;

Com as dragas no seu peito

Que extraem do seu leito

Um tesouro verdadeiro!

Lá vai o rio! Lá vai o rio!

Com seu futuro sombrio,

Sem ter voz para clamar:

Um pedido de socorro

Que se escute além do morro,

Pra que venham lhe ajudar!

Lá vai o rio! Lá vai o rio!

Outrora com tanto brio,

Tão saudável a passar...

Imponente e soberano,

Mas o próprio ser humano

É quem procura lhe matar!

RIO PARAÍBA

Rio Paraíba

violentado,

sangrado,

saqueado.

Rio Paraíba

desmatado,

cercado

e esbarrado.

Rio Paraíba

invadido,

extraído,

poluído.

Rio Paraíba

controlado,

minguado,

privatizado.

Rio Paraíba,

que saudade

da liberdade...

da integridade!

Rio Paraíba,

berço da vida,

água bebida...

— que saudade!

ESSE RIO QUE EXISTE AGORA

Esse rio que existe agora

tão diferente na lida,

será o mesmo d'outrora,

da nossa infância querida?

Esse rio que existe agora

d'água suja, poluída,

será o mesmo d'outrora

ou é outro rio sem vida?

Esse rio que existe agora

sem ter mais força no ventre,

será o mesmo d'outrora

ou corre morto somente?

Esse rio que existe agora,

sem árvores em suas margens,

será o mesmo d'outrora

ou será uma miragem?

Esse rio que era tão limpo,

d'água pura, cristalina,

não sacia mais a sede

desta terra nordestina!

Esse rio que era tão cheio

de tilápia e de pial,

por que está assim deserto?

Nos responda o homem mal!...

QUEM ESCUTA A VOZ DO RIO?

Quem escuta a voz do rio,

Quem escuta a sua voz?

Do rio que está clamando

Por socorro a todos nós!

Quem escuta a voz do rio

E dele se compadece?

Pois o rio está clamando

Por socorro, pois perece!

Quem escuta a voz cansada

Das águas tão poluídas?

Quem escuta a voz do rio

Lutando para ter vida?...

Quem escuta a voz do rio

Nos clamando, em desespero,

Consumido pelas dragas,

A ganância do areeiro?...

Quem escuta a voz das águas?

Quem escuta a voz do leito?

Pois quem deixa a voz do rio

Adentrar para o seu peito?...

Atentai pro seu clamor,

Criança, jovem, adulto;

Não deixem o rio morrer,

A terra ficar de luto!

QUANTO VALE A AREIA DO RIO?

Quanto vale a areia do rio

que a natureza juntou?

anos e anos, a fio,

tesouro que ela guardou.

Quanto vale a areia do rio

onde o vento deita e rola?

Quanto vale a areia do campo

onde eu brincava de bola?

Quanto vale, queremos saber,

a areia do Rio Paraíba?

que estão, todo dia, a vender,

agredindo o leito, a vida!

Quanto vale a areia do rio?

Entregue em troca de nada?

Ou vendida a preço d'ouro,

tesouro da terra amada!

Por homens gananciosos

que fazem negociata.

Quanto vale a areia do rio,

do rio que se fere e mata?!

O HOMEM NÃO É UM BICHO (?)

O homem não é um bicho,

mas se torna um bicho-homem;

quando ele polui o rio

das águas que ele consome!

O homem não é um bicho,

mas perde todo renome,

quando ele polui as águas

dos peixes que a gente come!

O homem não é um bicho,

mas esse nome faz jus;

quando ele joga no rio

o lixo que ele produz!

O homem não é um bicho,

mas se torna um bicho-homem;

quando agride a natureza,

não tem outro cognome!

NO LEITO DO RIO PARAÍBA

No leito do Paraíba

Tinha tudo o que se pensar!

Tilápia, camarão,

Piabas, de montão,

Pro pobre se alimentar.

No leito do Paraíba

O povo encontrava alento,

Pastoreava seu gado

E colocava roçado

Para o seu mantimento.

No leito do Paraíba

Também tinha diversão:

Um futebol animado,

Depois banhar-se, suado,

Nas águas, com emoção!

O que restou de seu leito?

— Hoje só recordação

Guardamos no nosso peito,

Daquele tempo passado

Dum rio belo e perfeito.

Do leito do Paraíba

O que restou para o mundo?

— Um rio sujo, tão imundo,

Um leito tão degradado,

Um rio tão moribundo!

Do leito do Paraíba,

Deste torrão brasileiro,

O que deixou para a vida

A empresa do areeiro?...

Crateras e mais crateras,

Um deserto verdadeiro!

Com seu leito saqueado,

E exportado pro estrangeiro.

Por que tanta ambição

Do homem pra ter dinheiro?

Destruindo a natureza,

Um rio tão prazenteiro!

Oh rio da minha infância,

Haverá pra ti saída,

Para escapar da ganância

Dos areeiros da vida?!...

VOZ DAS ÁGUAS

Voz das águas! Voz das águas!

Quem é que escuta as tuas mágoas?

Quem escuta o teu clamor

Clamando por mais amor?...

Clamando por mais limpeza,

Mais respeito à natureza.

Voz das águas! Voz das águas!

Quem é que escuta as tuas mágoas?

Quem é que escuta o teu grito,

O teu canto mais aflito,

Ecoando pelo Norte...

Relutando contra a morte...

Quem é que escuta as tuas mágoas?

Voz das águas! Voz das águas!...

TINHA UM RIO NO MEIO DO VALE

(Parodiando Carlos Drummond de Andrade)

Tinha um rio no meio do vale

No meio do vale tinha um rio

Tinha um rio no meio do vale

No meio do vale tinha um rio

Tinha um rio...

Nunca me esquecerei desse acontecimento

Nas cenas de minha infância passada

Que no meio do vale tinha um rio

Que tinha um rio no meio do vale

Tinha um rio...

Um rio de águas cristalinas

Um rio cheio de peixes...

Um rio que poluíram...

Um rio que assassinaram...

Tinha um rio no meio do vale

Que nunca me esquecerei.

RIO MORTO

(Parodiando Manuel Bandeira)

Onde as águas puras do passado

Produziam vida em abundância

Contemplo agora a realidade

Da degradação do presente,

Onde escorre, na areia, o rio morto.

Rio morto, rio morto, rio morto.

Águas de paisagem cristalina

Que abasteciam os ribeirinhos!

Águas, potáveis águas,

Para bebermos jamais.

Se perderam com o rio morto.

Rio morto, rio morto, rio morto.

Rio morto, rio injustiçado

Rio violentamente, rio

Morto, sem motivo algum,

Razão nenhuma. O que foi

Ficou no passado.

Agora é apenas um rio morto

Rio morto, rio morto, rio morto.

— Antonio Costta

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POEMAS DE MEU LIVRO: "QUEM ESCUTA A VÓS DO RIO?"

Disponível neste link:

https://clubedeautores.com.br/livro/quem-escuta-a-voz-do-rio