RIO IMPETUOSO

RIO IMPETUOSO

Num ímpeto,

apanho um verso,

que desce desgovernado

na correnteza do rio;

sabendo que nesse instante,

a poesia

se faz presente

influindo a imaginação;

me oferecendo

algum motivo habitual

para construir o poema,

a partir

do fluir livre

das águas do rio impetuoso.

Nem penso

em apanhar algum

dos diversos objetos que descem

encharcados

pela correnteza apressada;

salvo alguém

que vejo se afogando,

sufocado pelas águas

barrentas do rio;

passando bem perto do alcance

de minhas mãos estendidas;

demonstrando

a boa intenção

de o salvar da morte iminente,

desafogando-o,

e lhe devolvendo a vida.

A poesia

é indiferente aos objetos sem vida,

descendo imprestáveis

na correnteza veloz;

mas é solidária a vida humana,

que aloja a vida espiritual,

que não teme morrer

porque é eterna;

o poema então,

apoiado nos versos socorristas,

não finge está alheio

a destruição causada

pela enchente do rio;

e faz a sua parte artística

tecendo palavras

de bom ânimo,

tentando conter o ímpeto do rio,

que não dá sinal até agora,

de baixar o nível

de suas águas tempestuosas.

Entretanto,

o barulho das águas

fluindo desvairadas,

reflete no poema apenas

o lamento silencioso

dos povos ribeirinhos

que ficaram desabrigados;

sem as casas,

sem os pertences domésticos,

nutrindo-se somente

da esperança por melhores

dias vindouros...

E desse modo,

o que a poesia faz

é ser partícipe

abstrata da ocorrência das coisas;

cabendo ao poeta

descrever a realidade instantânea

que lhe inspira,

inobstante de feição artística;

mas que revela

na retórica dos versos livres,

a ação violenta

de um rio,

cuja natureza se desequilibra,

indignada,

num mundo ainda

com tamanhas imperfeições...

Escritor Adilson Fontoura

Adilson Fontoura
Enviado por Adilson Fontoura em 01/08/2019
Código do texto: T6710237
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