NATUREZA
Súbita e impetuosa ao tocar o asfalto
E na copa das árvores os galhos trêmulos
A chuva deságua calma e sibilante
Desabrigando pássaros que decerto pânicos
Em busca de sombra se vão nesse instante.
No conforto da sala, nós, à maneira dos pássaros
Covardemente ouvimos seu segregado canto
Evocar, sem que o vejamos, húmidas imagens.
E fechamos as janelas, assim nos privando
De seu timbre em encantos, do céu a derramar-se.
Temerosos são animais defronte à
espontâneas forças que os transcendem:
- Oh, chuva esta que não cessa
Chove longa e sem ter pressa
Cai gota à gota na terra gasta!
Oh chuva quente que perpassa
As vidas sedentas dessa massa
Que sua queda não sejas nefasta
Mas lave as raízes desta terra.
(...)
Passado o espanto, o frio e o medo
Cantam os pássaros ao fim da tarde.
Assoviando a saudade e seu degredo
Em paz, afinal, passada a tempestade
Ergue-se nas ruas tal forma perfeita:
Os sons se alinham todos em quietação.
Restando no ar somente a voz rerefeita
Dos pássaros a solar dissonante canção.