Água
 
Molha-me, habitat ancestral,
sem a pompa dos rituais,
porém com o exemplo da nobreza leve
a que jamais te furtas;
com a docilidade a que te submetes
a tantos caprichos;
por dentro e através de mim
quando quase só te sinto
bem mais que te vejo.
 
Desde qualquer dos muitos
lugares do universo
sabendo-se, estarás
e haverá vida;
desde a afirmação
das próprias escrituras
que só ratificas
teu propício ofício;
desde o ar que umedeces,
ao solo que encharcas,
à luz dividida em faixas,
a força que exerces,
os tons que te disfarçam
os estados de que te vestes...
 
...E o mau uso que fazemos de ti
todos nós sabemos:
nalgum momento
não especificado
te recuperarás
e nós, talvez,
nem testemunhemos.