UM RIO DE AMOR
Do rio Tietê,
eu não admiro o brilho do sol sobre suas águas.
Não me parece bela
a cidade agora luminosa sobre essa borracheira,
(anoiteceu contaminada).
Não me assustam as trilhas dos faróis
a correr em marginais de asfalto,
( neôns roncadores em trajetos quase líquidos),
pois o rio ainda é um lutador.
Esse onde escavam o leito
a procurar o esterco inodoro, o chorume imemorial,
o dejeto magnífico.
Não me vale também o testemunho,
dos que percebem o esgoto a céu aberto
para a morte do rio,
quando dizem, após o mercúrio denso
que por ali cedeu :
O rio foi um metal de transição nesse mundo
e por isso se findou!
O que me importa
é o ainda rio.
O rio em sua miragem liquida,
fluídica
- admirável como o traço azul
sobre o mapa imaginário da cidade –
e no ainda rio, flutua uma pérola.
Não é bem uma pérola que flutua,
mas o nariz encerado
de uma capivara viva.
DO LIVRO: "A CIDADE POSSÍVEL"