EM VENTANIA
Bate forte na janela
Bate forte a ventania
Zumbido penetrante
Zumbido de agonia
Circunda o quarto inteiro
Crava, deixa um rastro
Demarcando o espaço
Um redemoinho parado
Que ameaça crescer e crescer...
Nus, meus pés congelados
Num fino lençol, o corpo enrolado
Indefeso, abandonado
Sem o que se proteger...
Persistem ventos imortais
Pesados sentimentos pairam
Abro a ruidosa janela
Rosto e ar embebidos
Que atrito refrescante!
Cabelos escapam revoltados
Numa névoa vacilante
O céu cinza se esconde
Num horizonte perdido
Longe de terríveis atribulações
Essa ventania não cessa
Ela vem e tem pressa
Para seu rumo seguir
Infiltra-se desesperada
Gira desajeitada no meu peito esguio
Sinto um leve entorpecer
E nada mais importa agora
Apenas os ventos confortam a demora do amanhecer
Embalam em frios braços meu corpo vazio
Leva embora tempos passados
Amedrontados sorrisos roubados
Desperto apavorado
Uma sonolência profunda
E chove a chuva ainda
Clara transparência linda
Caem em minhas secas faces
Gotas penetrantes de alegria
Lava-me a já deserta alma petrificada
Agora, sou os floridos lírios do campo
As correntezas das águas dos rios
Singela beleza orquestral
Zumbidos querem ser ouvidos
Essas suaves vozes guturais
Jamais cansarei de ouvir
Preciso outra vez sentir
Enquanto existir a existência
Até que tudo retorne ao pó...