CANTOS E VOOS LIVRES.
OS MALVADOS DEVIAM DÁ A LIBERDADE
QUE MERECEM OS NOSSOS PASSARINHOS.
Passarinho cantando na gaiola
E o dono de fora escutando
Sem saber que ele está cantando
É porque chora e vive de esmola
Essa prática que no mundo assola
Cometida pelos gestos dos mesquinhos
Feri as aves como agudos espinhos
Inflamados com o julgo da maldade
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
Quem inventou a besteira do viveiro
Na certa na vida nunca foi preso
Viveu sempre satisfeito e ileso
E bem longe do terrível cativeiro
Mas talvez pela droga do dinheiro
Preferiu andar em maus caminhos
Se serviu de pedacinhos de pinhos
E deu vaga para a sua crueldade
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
O canto da liberdade não tem preço
Nem o voo deve ser aprisionado
Nem o ninho deve ser abandonado
Nem seu dono mudar de endereço
Quando escuto essas coisas eu padeço
A tristeza faz em mim redemoinhos
Quando vejo pendurados e sozinhos
Batendo suas asas sem vontade
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
Se a floresta falasse ela dizia:
Não me toque e nem tire o que é meu
Tudo isso que eu tenho Deus me deu
Eu não quero ser roubada todo dia
Vá embora com a sua arma vazia
E nos deixe de uma vez viver sozinhos
Nossa fauna nossa flora nossos ninhos
Não são feitos para a sua vaidade
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
A asa branca é a ave do sertão
Que inspirou uma moda afamada
Mas na moda não está escravizada
Veja a letra e preste muita atenção
Quem cantou foi o nosso rei do baião
Seu Luiz padrinho de Dominguinhos
No entanto nunca prendeu seus bichinhos
Foi embora nos deixando com saudade
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
Mas o homem é terrível e traiçoeiro
Traz na mente toda intenção maluca
Vai pra mata para armar arapuca
Faz do pássaro um reles prisioneiro
Se envaidece com o feito desordeiro
Exibindo a caça para os vizinhos
Que não sabem que os bichos coitadinhos
Vão penar por falta de caridade
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
Na fazenda corre solto o zebu
E o galo comanda o galinheiro
A galinha dorme solta no poleiro
E na areia faz carreira o tatu
Pelo céu voa alto o urubu
E no rio nada livre os peixinhos
No entanto os pequenos canarinhos
Cantam presos na gaiola da maldade
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
Ouvindo o curió louvar a vida
Com o papo cheio de grão de alpiste
Soa em mim um lamento fraco e triste
Porque que sei que ele canta a despedida
Condenado com a vida oprimida
Só lhe cabe um cocho e uns pauzinhos
Uma água pra beber só de pouquinhos
E de resto só o canto e a saudade
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
Que importa fazer uma armação
Equipada e pintada de verniz
E exibi-la bem acima do nariz
Se traz nela a ave na escravidão
Sem espaço pra voar na imensidão
Sem sementes para bicar nos caminhos
Sem a mata para costurar seus ninhos
E sem galhos para pousar pela tarde
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
Quem já teve em casa um quintal
Volte agora ao bom tempo de criança
Feche os olhos e veja que balança
As folhas de um velho bananal
Umas lagartas grudadas no laranjal
Sem ferir-sem na ponta dos espinhos
E no muro arrulhando dois pombinhos
Ambos livres do laço do covarde
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
Imagine uma águia no penhasco
Espreitando sua presa bem distante
E de lá ela desse um voo vazante
Bem em cima do lombo do carrasco
E dissesse:é agora que eu te lasco
Tu serás escravo dos meus filhotinhos
Vais pagar por esses maus caminhos
Tratando aves com perversidade
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
Se cantar atraísse a prisão
Sabiá nasceria sem cantar
E na mata ninguém ia escutar
O concriz a perdiz e o azulão
A floresta era muda sem canção
Só o som das folhas em desalinhos
Se ouvia balançar nos ribeirinhos
Com as águas á bater na cavidade
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
Suas cores são lindas e diversas
Mas perecem serem pintadas a mão
No entanto o pincel da criação
Coloriu as plumas em remessas
Mas o homem com ganância e com pressas
Prende o voo vende o canto dos bichinhos
E assim vão lucrando esses mesquinhos
Escondendo pra si mesmos a verdade
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
Quem já viu na praia os coqueirais
Abanando com as folhas o chão quente
E a onda se erguendo imponente
Enfeitando de espumas os corais
Brancas aves são as garças colossais
Livremente beliscando os peixinhos
E o mar parecendo com moinhos
Dando giros na maior velocidade
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
Imaginem o éden sendo um viveiro
E uma gaiola encomendada por Adão
Eva fabricando um alçapão
E a serpente sendo um passarinheiro
Este plano não seria o do Cordeiro
Que sofreu com a coroa de espinhos
Nem estava escrita em pergaminhos
Nem a Bíblia contaria essa maldade
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
E a pomba que foi solta por Noé
Se tivesse no porão trancafiada
Noé nunca iria saber nada
Apesar de ter nele muita fé
É por isso que a liberdade é
Uma dádiva para os bichinhos
A pomba trouxe no bico uns raminhos
Dando assim um sinal de honestidade
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
Imaginem um pirata sem navio
A procura de uma perna de pau
Em seu ombro carregando um bacurau
Ao invés de um papagaio bravio
Tudo isto estaria por um fio
Só restando alguns barris de vinhos
No porão o papagaio preso em linhos
Para ser bem vendido na cidade
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
Mas voltando ao mundo vivo e real
Nossa fauna tá passando por perigo
Com os pássaros morrendo por castigo
Da ganância do traficante do mal
É preciso uma mudança radical
Pra salvar de vez os amiguinhos
Que nos fazem bem, mas em seus ninhos
Pra cantarem livres da privacidade
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
Tudo que possui pena e bico
Tem assim seu habitat natural
Reproduzem os seus ninhos no matagal
Como faz a fêmea do tico-tico
Assim fica o mundo muito mais rico
E a fauna segue em paz os seus caminhos
Sem gaiolas nem viveiros apertadinhos
Nossos pássaros terão a longevidade
Os malvados deviam dá a liberdade
Que merecem os nossos passarinhos.
Se você é feliz livre e completo
Não comungue com essa parca perdição
As gaiolas e aos viveiros diga NÃO
E mantenha o seu peito sempre aberto
Que um dia nosso céu será coberto
De pardais juritis e canarinhos
Só assim esses nossos irmãozinhos
Vão cantar pra nossa felicidade
E os malvados irão ver em liberdade
Toda a espécie de nossos passarinhos