ÁGUA POÉTICA
Provém de mim agora
como filete de água,
os versos dessa hora
sem dor, sem mágoa;
e o poeta comemora
a água que deságua
em forma de poesia,
a descer pela torrente
do rio cheio noite e dia;
num gemer de enchente,
cuja chuva bem tardia
molha a terra carente.
A poesia vai se molhando
nos frios versos chuvosos;
o camponês vai plantando
teus férteis grãos viçosos;
e o poeta vai se inspirando
em teus rios tão chorosos.
Chuva que desaba aquosa
sobre a terra encharcada;
flui a poesia tão invernosa
no estrondo da trovoada;
casa caiada toda alagada;
água poética tão chorosa.
Ó poética, a fluir de mim,
qual lírico rio caudaloso,
cujo pranto soa no clarim;
o vento no tempo chuvoso
traz a música do bandolim,
traz a voz do rio melodioso.
O poeta, enfim, tão contente,
deixa fluir a chuva na poesia;
deixa que o rio tão plangente,
sorria, como o sol, de alegria;
pois há na alma de toda gente,
a poesia divina de eterna valia!